1. INTRODUÇÃO

Levando-se em consideração as dúvidas que envolvem temas pontuais do direito sucessório, verificou-se a relevância da análise e diferenciação das hipóteses de exclusão do direito sucessório, quais sejam: indignidade e deserdação.

Para tanto, inicialmente far-se-á uma breve explanação a respeito do conceito de capacidade sucessória e a distinção entre ilegitimidade sucessória e exclusão do direito sucessório, passando-se, por fim, à análise do objeto principal da presente pesquisa, ou seja, das causas de exclusão do direito sucessório pela indignidade e deserdação.

  1. CAPACIDADE E EXCLUSÃO SUCESSÓRIA

Com a abertura da sucessão, ou seja, havendo o falecimento de uma pessoa que deixa bens a inventariar, se faz necessária a observância de alguns requisitos para a configuração da capacidade de suceder (que não se confunde com a capacidade civil, uma vez que uma pessoa incapaz para os atos da vida civil pode adquirir capacidade sucessória) dos herdeiros. É nesse cenário que entra a verificação da capacidade sucessória, que nada mais é do que a aptidão que determinada pessoa deve possuir para adquirir a condição de herdeiro (legítimo ou testamentário), de acordo com os requisitos elencados na legislação e vir a receber sua quota parte. Em outras palavras, o herdeiro deve preencher a condição disciplinada pelo Código Civil em seu artigo 1.798 para então adquirir legitimidade para suceder, ou seja, deve ter nascido ou ter sido concebido[1] à época da abertura da sucessão (DIAS, 2013).

Todavia, ainda que o herdeiro cumpra o requisito disposto no artigo supracitado, ou seja, possua capacidade sucessória quando da abertura da sucessão e em um primeiro momento aparente ter direito a receber sua quota parte do acervo hereditário, há que se verificar ainda se ele não se enquadra em uma das hipóteses de exclusão[2] do direito sucessório elencadas nos artigos 1.814 e 1.961 do Código Civil, quais sejam: a indignidade e a deserdação, que serão analisadas separadamente em momento oportuno.

Com relação à indignidade e deserdação, apesar de possuírem características distintas entre si, ambas as possibilidades resultam na mesma consequência, ou seja, na exclusão do direito sucessório do herdeiro e visam “trazer mecanismos de coerção contra a maldade, a traição, a deslealdade, a falta de respeito, a quebra de confiança e outras agressões praticadas em clara lesão à dignidade humana” (TARTUCE, 2017, p. 101) do de cujus. Em outras palavras, Dias (2013) apresenta as modalidades de exclusão do direito sucessório como uma forma de penalização ao sucessor que se portar de forma injusta com o autor da herança e/ou seus familiares.

Ainda, antes de adentrar na análise do objeto principal da presente pesquisa e, a fim de evitar eventual equívoco, faz-se necessário esclarecer que a falta de legitimidade para suceder não se confunde com exclusão do direito de suceder. Enquanto que a primeira diz respeito a uma condição objetiva para adquirir aptidão de herdar algo, a segunda pressupõe a caracterização da condição de herdeiro que, em decorrência da prática de alguma das atividades prevista na legislação é considerado indigno ou ingrato e perde o direito ao quinhão hereditário (TARTUCE, 2017).

Vistas as considerações iniciais, passa-se à análise das duas hipóteses de exclusão do direito sucessório, quais sejam: indignidade e deserdação.

  • EXCLUSÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO POR INDIGNIDADE

A hipótese de exclusão do direito sucessório por indignidade está disciplinada no artigo 1.814 e seguintes do Código Civil, e diz respeito ao “[…] incurso em falta grave contra o autor da herança e pessoas de sua família” (DINIZ, 2011, p. 65), impedindo que o sucessor, apesar de possuir legitimidade sucessória, receba sua quota parte.

De acordo com Coelho (2010), a exclusão pela indignidade se aplica a todos os tipos de sucessão (legítima, testamentária e legatária) e as hipóteses para sua configuração estão disciplinadas taxativamente (não admitem interpretação extensiva) no artigo 1.814 do Código Civil, sendo elas:

  1. Sucessor que houver sido autor, coautor ou partícipe de homicídio doloso (intenção), ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente;

Para configuração da indignidade por essa hipótese faz-se necessário o trânsito em julgado da sentença penal que condene o sucessor pela conduta praticada, sendo que caso reste configurada sua absolvição na esfera penal pela inexistência de fato ou autoria, reconhecimento de legítima defesa, estado de necessidade ou exercício regular de um direito, a pena pela indignidade na esfera cível também deve ser afastada (TARTUCE, 2017).

  1. Sucessor que houver acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorrer em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro; e,
  2. Sucessor que, por violência ou meios fraudulentos, inibir ou obstar o autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade.

Em qualquer dos casos faz-se necessária a instauração de ação própria para apurar a indignidade do sucessor, sendo que apenas a sentença transitada em julgado declarará ser ele digno ou não de receber sua quota parte. Caso o herdeiro seja considerado indigno, os descendentes o sucederão como se falecido fosse, uma vez que os efeitos da exclusão do direito sucessório são pessoais e atingem somente aquele que praticar um dos atos acima elencados (DINIZ, 2011).

Por fim, o sucessor indigno pode adquirir novamente o direito de suceder caso o ofendido (autor da herança) o reabilite expressamente em testamento ou outro documento autêntico (DINIZ, 2011).

Isto posto, analisada a hipótese de exclusão do direito sucessório pela indignidade, passa-se à análise da hipótese de exclusão pela deserdação.

  • DA EXCLUSÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO POR DESERDAÇÃO

Assim como a hipótese de exclusão do direito sucessório por indignidade, a deserdação é mais uma forma de “[…] afastar herdeiros da sucessão hereditária” (DIAS, 2013, p. 321). No entanto, diferente da indignidade, a deserdação se aplica somente aos herdeiros necessários[3], desde que o autor da herança manifeste sua vontade por meio de testamento e haja motivação da causa para tanto (DIAS, 2013).

O rol de hipóteses para exclusão do direito sucessório pela deserdação é mais extenso que pela indignidade, uma vez que a deserdação além de poder restar configurada por todas as possibilidades da indignidade, possui um rol descrito nos artigos 1.692 e 1.693 do Código Civil, quais sejam:

  1. Deserdação dos descendentes por seus ascendentes:

a.1) ofensa física;

a.2) injúria grave;

a.3) relações ilícitas com a madrasta ou com o padrasto; e,

a.4) desamparo do ascendente em alienação mental ou grave enfermidade.

  1. b) Deserdação dos ascendentes por seus descendentes:

b.1) ofensa física;

b.2) injúria grave;

b.3) relações ilícitas com a mulher ou companheira do filho ou a do neto, ou com o marido ou companheiro da filha ou o da neta; e,

b.4) desamparo do filho ou neto com deficiência mental ou grave enfermidade.

Como ocorre na exclusão do direito sucessório pela indignidade, em todos os casos que haja testamento requerendo o reconhecimento de ingrato faz-se necessária a instauração de ação própria para comprovar que a causa informada no testamento condiz com alguma das possibilidades trazidas pela legislação. Outrossim, apesar de não ser unânime o entendimento, tem-se que os herdeiros do declarado ingrato têm o direito de representá-lo e receber o quinhão que lhe era de direito. Por fim, o deserdado pode ser reabilitado desde que haja expressa manifestação nesse sentido pelo autor da herança em um novo testamento (DIAS, 2013).

  1. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Tendo em vista a quantidade de informação disponível nos dias atuais é possível prever e programar a destinação de determinado patrimônio, como também eventual exclusão do direito sucessório de um herdeiro. Neste último caso, dependendo do fato que gerou a possibilidade de exclusão, configurar-se-á pela indignidade ou deserdação.

Nesse sentido, apesar de possuírem características diversas e não se confundirem, a indignidade e a deserdação têm grandes semelhanças e possuem a mesma consequência: exclusão do direito sucessório.

Dentre as principais diferenças das duas formas de exclusão do direito sucessório, tem-se que a indignidade decorre de lei e para sua configuração não é necessária a manifestação de vontade do autor da herança, enquanto que a deserdação deve estar expressamente prevista e decorre de testamento.

Diante disso, verifica-se a importância do conhecimento e esclarecimento a respeito das duas hipóteses de exclusão do direito sucessório para verificação de qual das modalidades se aplica ao caso concreto, uma vez que versam a respeito de direito sucessório e não devem/podem ser utilizadas como mera ferramenta de penalidade sem qualquer justificativa.

REFERÊNCIAS

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: família, sucessões. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

DIAS, Maria Berenice. Manual de sucessões. 3. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito das sucessões. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

TARTUCE, Flávio. Direito Civil: direito das sucessões. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017.

[1] Pertinente à capacidade sucessória, a presente pesquisa limitou-se a abordar apenas a relativa aos herdeiros legítimos ou testamentários que sejam pessoas físicas e já tenham nascido ou sido concebidos ao tempo da abertura da sucessão, não versando sobre a possibilidade disposta no artigo 1.799, I c/c 1.800, §4º do Código Civil (herdeiro testamentário não concebido ao tempo da abertura da sucessão e que venha a ser concebido em até dois anos após o início).

[2] O termo empregado como “exclusão” pressupõe que o herdeiro possui capacidade para suceder e tenha aceitado o direito à herança.

[3] Descendentes, ascendentes e cônjuge, conforme artigo 1.845 do Código Civil.

A mother made his will. The mother decides who gets the inheritance.
        

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