Quando o tema é insolvência algumas considerações sempre são pertinentes. Vamos para a mais importante delas: não é crime falir, e, tampouco, isso deve ser moralmente reprovável.

Convivemos com o estigma de que a falência é um mal acachapante e que dela devemos fugir a todo custo, afinal, com origens que remontam tempos medievais, falir seria sinal maior de desonra comercial.

Não esqueçamos que tratamento parecido foi dado, até pouco tem e nesses curtos 10 anos de Lei n. 11.101/2005, àqueles que se socorriam à Recuperação Judicial. E o que se vê hoje? Incontáveis empresários reconhecendo os benefícios do instituto (quando bem aplicado) como meio de superação da crise.

E é nessa mesma linha que a falência merece ser encarada.

Pois bem, e o que fazer quando a empresa não se mostra mais economicamente viável e alcança a temida insolvência?

A maioria esmagadora do empresariado nacional opta, nessas circunstancias, pelo encerramento irregular das atividades, que, basicamente consiste em “fechar as portas” sem as regulares baixas ou pagamento dos credores. Tal opção, que foge das teorias empresariais, é delicada e implica consequências a serem ponderadas pela análise do caso concreto (da viabilidade, do ativo, do passivo), e amparadas por assessoria de gabaritados profissionais do Direito Falimentar, mas, principalmente, depende do estudo da forma com a empresa chegou a tal ponto crítico.

Diz-se isso porque o empresário que tenha guiado a sociedade pelos trilhos da lisura, de regulares registros contábeis e que não tenha praticado atos dolosos na administração, é aquele pensado pelo legislador para um meio regular de encerramento da pessoa jurídica: a autofalência.

Logo, respondido o questionamento do título, surge outro: Sabendo que posso, devo? Aqui a resposta é menos conclusiva: Depende.

Importante esclarecer: não se encoraja o encerramento irregular da atividade – afinal, assim o fazendo a lesão aos credores, e seus relacionados, alcança monta ainda maior do que aquela apurada como passivo – mas, em verdade, se defende a criteriosa análise de caso, orientando-se a resultados na escolha pela autofalência, pela recuperação judicial ou, ainda, pela reestruturação empresarial.

Fechar ou falir?

A autofalência (art. 105 da Lei n. 11.101/2005), que é tida pela lei como um dever, mas que, em termos práticos, acaba por não receber obrigatoriedade pelo empresariado – principalmente por não haver pena àquele que não a adota – consiste em alternativa à sociedade empresária insolvente, ou seja, àquela em que o passivo supera o ativo de modo irrecuperável.

Muito embora esteja em fase embrionária perante os tribunais do país, a autofalência tem despontado como sugestão ao empresário que pretende colocar uma data precisa ao encerramento da empresa, mas que não dispõem de recurso para a liquidação voluntária (hipótese em que haveria a quitação de todas as obrigações e apuração de haveres). Com isso, pode-se dizer: caminha-se para um futuro em que “empresas zumbis” (aquelas que fecharam as portas, mas não as contas) não sejam a maioria.

Essa visão, talvez utópica, surge das recentes revisões de conceitos quanto ao Direito Falimentar/Recuperacional e da intensa militância dos credores prejudicados com encerramentos irregulares que, em juízo, alcançam a desconsideração da personalidade jurídica ou o redirecionamento das execuções (fundamentados no art. 50 do Código Civil e desdobramentos). Ou seja: os sócios, por descumprirem responsabilidades fundamentais com o encerramento irregular, passam a responder pelos débitos que a empresa não honrou enquanto ativa, além da proporção que contribuíram para o capital social, em exceção à regra geral que prevê a limitação das responsabilidades dos à medida da participação societária no capital social (art. 1052 do Código Civil).

O temido alcance do patrimônio pessoal dos sócios também pode acontecer em um processo de falência, não nos enganemos. Isso porque a lei geral brasileira prevê a responsabilização pessoal quando da prática de atos contrários à sociedade empresarial (art. 1080 do Código Civil). Logo não poderia ser diferente na lei falimentar. A diferenciação, porém, está na indispensável evidenciação de que o sócio contribuiu, por seus atos ou omissões, com a crise irremediável da empresa (art. 82 da Lei n. 11.101/2005).

Nessa esteira, requerer a própria falência gera um efeito inversamente proporcional a ter a falência requerida por um credor (pelas razões do artigo 94 da Lei n. 11.101/2005). Fala-se em uma presunção de boa-fé, afinal no pedido de autofalência se tem o devedor reconhecendo sua insolvência e demonstrando a intenção de gerar a mínima lesão possível – postura bem vista pelo juízo falimentar e pelos credores – enquanto que noutro cenário, tem-se um credor descontente pedindo a falência da empresa que não honrara com seus compromissos. É justamente nessa segunda hipótese que se encontra uma porta à responsabilização pessoal dos administradores, afinal, mesmo cientes da crítica situação da empresa, estes se recusaram a buscar o amparo jurisdicional, no tempo de viabilizar uma recuperação ou pedir falência.

O dolo e a culpa no comando da atividade são reprovados, ainda, pelo Código Tributário Nacional, que independente do estado de insolvência, responsabiliza pessoalmente e ilimitadamente os diretores, gerentes e representantes da pessoa jurídica (art. 135 e 134 do CTN).

Um adendo merece ser feito. Toda vez que se fala em responsabilização pessoal do sócio (administrador ou não), deve-se ter em mente que alguns bens não serão alcançados, a exemplo: aqueles tidos como impenhoráveis (art. 649 do Código Civil), os bens de família (Lei n. 8009/90), a meação do cônjuge (Lei n. 4121/62) e aqueles gravados com cláusula de inalienabilidade (art. 1191 do Código Civil).

Não se apurando a responsabilidade dos sócios, seu quinhão na sociedade ainda pode ser atingido (indispensável, então, a integralização das quotas), caso se constate que o ativo não bastará para saldar o passivo, não havendo prejuízo se, após a liquidação das quotas, os credores não tenham satisfeito seus créditos.

Em linhas gerais…

A situação empresarial brasileira convida à revisão de paradigmas sobre institutos como a Recuperação Judicial, a Falência, e, sobretudo, quanto à autofalência.

Pedir a própria falência representa, em verdade, um meio de se evitar a perda desorganizada do ativo, de limitar a responsabilidade do quadro societário e, essencialmente, organizar o passivo e frear o anseio dos credores (que até então teriam poder quase que ilimitado de investidas sobre a sociedade e até seus sócios).

De todo modo, a melhor alternativa aplicável deve ser fruto de uma ampla e detalhada análise profissional.

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