Sancler S. A. Lombardi*

 Resumo:

 

O presente artigo tem o condão de efetuar uma detida análise acerca da possibilidade do manejo do Agravo exposto no art. 544 do Código de Processo Civil frente a acórdão que julga a demanda improcedente com base na lei de Recursos Repetitivos (Lei. 11.672).

 

 

Palavras Chave: Processo. Civil. Agravo. Recurso. Repetitivo. Direito.

1) Introdução

Vivendo um momento ímpar na sociedade nacional, o Poder Judiciário é hoje, de acordo com as mais atuais pesquisas, o mais confiável e atuante Poder da República Federativa do Brasil. Todavia, o reconhecimento e o prestígio popular vêm precedidos de certos ônus, destacando-se a morosidade como o mais contundente.

            Com base nesta realidade, o direito pátrio tem sido alvo de constantes reformas, todas com o condão de garantir ao jurisdicionado maior celeridade processual, ou, em outras palavras, favorecer o rápido andamento de processos que costumavam se prolongar durante as décadas.

            Uma das inovações legislativas, no tocante a celeridade processual, foi a promulgação da Lei 11.672 em maio de 2008, que instituiu o regime dos Recursos Repetitivos no âmbito do Superior Tribunal de Justiça.

            Este diploma legal prevê a possibilidade de o Tribunal de origem sobrestar todos os Recursos Especiais referentes a uma mesma matéria, remetendo alguns exemplares ao Superior Tribunal de Justiça, a fim de que seja exarado entendimento uníssono acerca da controvérsia, devendo o Tribunal a quo, após o julgamento da matéria, negar seguimento aos Recursos Especiais que estiverem em contradição com o entendimento, agora pacífico, do STJ.

            Entretanto, é de conhecimento amplo entre os operadores do Direito que, contra decisão que nega seguimento ao Recurso Especial ou ao Recurso Extraordinário, cabe Agravo nos próprios Autos, com a posterior remessa destes ao Tribunal competente, por força do comando insculpido no art. 544 do CPC.

            A interposição deste recurso faz com que os autos sejam, compulsoriamente, remetidos ao Superior Tribunal de Justiça e/ou ao Supremo Tribunal Federal, não tendo o Tribunal a quo a possibilidade de impedir o seu prosseguimento.

            Assim, analisando os dois comandos processuais isoladamente, verifica-se a criação de um estado de desconforto jurídico, frente ao choque de normas que, em tese, deveriam regular a mesma situação jurídica, mas se mostram incapazes de coexistir no mesmo plano de validade e aplicabilidade.

            Isso porque, se o regime dos recursos repetitivos faz com que o Superior Tribunal de Justiça não conheça dos Recursos Especiais que visam atacar decisões já consolidadas, por ocasião de julgamento de recursos idênticos, como poderia um recurso autônomo devolver ao Tribunal Superior o reexame de toda a matéria?

            Por esta razão, a controvérsia foi alvo de recente Questão de Ordem levantada pelo Ministro Presidente do Superior Tribunal de Justiça, conforme fundamentação a ser apresentada no momento oportuno.

            Porém, antes de adentrar no mérito do conflito das normas, é importante esclarecer alguns pontos acerca da Lei de Recursos Repetitivos, assim como do Agravo insculpido no Art. 544 do Codex Processual vigente.

2) Recursos Repetitivos

           

Primeiramente, é de vital importância esclarecer o que são os Recursos Especiais Repetitivos. De acordo com a disposição literal da Lei 11.672/08, são todos aqueles que estejam fundamentados em idêntica questão de direito e que sejam interpostos por incalculável número de jurisdicionados perante o Poder Judiciário.

            Cabe esclarecer que a lei prescreve que em ?idêntica questão de direito? em razão da rediscussão de matéria fática ser expressamente proibida em sede de Tribunal Superior, a teor do exposto na Súmula 7 do STJ.

            Já no que tange à quantidade de Recursos interpostos versados sobre a mesma controvérsia, os Tribunais têm entendido que somente aqueles que sejam interpostos em massa, ensejando a discussão por todo o país restarão assim caracterizados.

            Portanto, em uma breve análise, trata-se de regime diferenciado para o processamento dos Recursos Especiais, criado pelo legislador como mais um mecanismo voltado à efetivação da garantia constitucional da celeridade processual, permitindo que os Tribunais Superiores não precisem, forçosamente, enfrentar inócuos procedimentos de julgamentos de processos absolutamente idênticos.

            Neste sentido é o posicionamento da doutrina majoritária, que mostra fiel apoio à criação do referido regime especial de tramitação dos Recursos Repetitivos, conforme palavras esposadas pelo doutrinador Humberto Theodoro Júnior:

 

O fim da reforma promovida pela Lei nº 11.672/2008 é de economia processual. Busca-se evitar a enorme sucessão de decisões de questões iguais, com grande perda de energia e gastos, num tribunal notoriamente assoberbado por uma sempre crescente pletora de recursos.[1]

 

            Ainda, com relação à importância da reforma promovida pela Lei nº 11.672/2008, o doutrinador comenta:

 

A inovação procedimental, sem dúvida, representa um esforço da redução da demora que aflige a prestação jurisdicional no Brasil, em sintonia com a garantia constitucional da ?duração razoável? do processo e de observância de meios que ?garantam a celeridade de sua tramitação (CF, art. 5º, LXXVIII).[2]

Assim, encontra-se na referida lei o procedimento a ser seguido para a instauração do regime especial de tramitação dos Recursos Repetitivos, conforme comando do Art. 543-C ?quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, o recurso especial será processado nos termos deste artigo?, ou seja, é imperioso que os recursos sejam processados de acordo com o disposto no presente artigo, não sendo, portanto, uma faculdade dos Tribunais a utilização do regime diferenciado.

            Entretanto, o incidente pode ser instaurado tanto pelo juízo a quo como pelo próprio Superior Tribunal de Justiça, os quais serão ordenados por procedimentos distintos, que devem respeitar as previsões expressas dos §1º e §2º do Art. 543-C.

            Quando o regime especial for deflagrado pelo Tribunal a quo, deverá respeitar o comando insculpido no 543-C, §1º, que dispõe:

 

Caberá ao presidente do tribunal de origem admitir um ou mais recursos representativos da controvérsia, os quais serão encaminhados ao Superior Tribunal de Justiça, ficando suspensos os demais recursos especiais até o pronunciamento definitivo do Superior Tribunal de Justiça.

 

            Desta feita, configurada a existência de Recursos Repetitivos, o Presidente do Tribunal deverá, de plano, suspender a tramitação de todos eles e encaminhar um ou mais processos ao Superior Tribunal de Justiça, a fim de que os Ministros do STJ analisem a discussão e exarem seu entendimento com relação à controvérsia.

 

            Após a publicação do acórdão pelo Superior Tribunal de Justiça, o Presidente do Tribunal deverá cumprir o comando do §7º do Art. 543-C, ou seja, deverá negar seguimento aos recursos em dissonância com o entendimento solidificado do Tribunal ad quem, ou, nos casos em que o Superior Tribunal de Justiça decidir pelo provimento da demanda, deverá ordenar a análise de mérito dos processos suspensos.

 

            Tal medida visa garantir a uma maior celeridade processual, além da clara uniformização da jurisprudência pátria, haja vista obrigar os juízos de segunda instância a se pautarem por decisões de um órgão superior, dando ainda maior credibilidade ao princípio da segurança jurídica no tocante as decisões exaradas pelo Poder Judiciário.

 

            Porém, ocorre uma pequena mudança quando o incidente não é instaurado de ofício pelos Presidentes dos Tribunais de origem, e, sim, instaurado reflexamente pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme preconizado pelo §2º do Art. 543-C, que diz: 

                                             

Não adotada a providência descrita no § 1o deste artigo, o relator no Superior Tribunal de Justiça, ao identificar que sobre a controvérsia já existe jurisprudência dominante ou que a matéria já está afeta ao colegiado, poderá determinar a suspensão, nos tribunais de segunda instância, dos recursos nos quais a controvérsia esteja estabelecida.

 

Portanto, caso o Presidente do Tribunal a quo se omita e não realize o processamento dos Recursos Repetitivos pelo regime especial, caberá ao Ministro Relator no Superior Tribunal de Justiça, que primeiro conhecer da controvérsia alçada a sua competência, determinar que restem suspensos todos os processos versando sobre o mesmo tema, a fim de que esperem até o momento da publicação da decisão no processo exemplo.

 

Desta maneira, garante-se maior eficácia a norma, possibilitando que o Superior Tribunal de Justiça ordene o imediato sobrestamento dos feitos, impedindo a remessa desnecessária de recursos inócuos, cujo julgamento final já se conhece desde o momento de sua protocolização.

 

Após a realização do julgamento do processo ?paradigma?, os Tribunais deverão declarar encerrado o sobrestamento dos Recursos Repetitivos, relegando a eles uma das decisões dispostas no §7º, I do Art. 543-C.

 

Entendendo que a decisão do recurso exemplo atingirá pessoas diversas dos litigantes do Recurso Especial, a lei faculta ao ministro relator a possibilidade de ouvir pessoas e entidades interessadas no fiel e imparcial deslinde do feito, conforme se extrai do §4º, que comanda que ?O relator, conforme dispuser o regimento interno do Superior Tribunal de Justiça e considerando a relevância da matéria, poderá admitir manifestação de pessoas, órgãos ou entidades com interesse na controvérsia?.

Destaque-se, por fim, que em 07/08/2008, o Superior Tribunal de Justiça publicou a Resolução nº 8, destinada a regulamentar o processamento dos Recursos Especiais Repetitivos no âmbito do STJ, respeitando assim o comando do §9º do art. 543-C.[3]

Portanto, verifica-se que a criação do regime especial dos recursos repetitivos é um marco na caminhada rumo a um Judiciário mais célere e eficaz, garantidor da segurança jurídica e do fiel cumprimento do devido processo legal.

 

 

3) Agravo contra decisão que nega seguimento ao REsp

 

            Conforme comando legal, a decisão do Tribunal de origem que nega seguimento ao Recurso Especial deve ser desafiada por Agravo, apresentado nos próprios autos, nos termos do art. 544 do Código de Processo Civil.

            Tal medida tem o condão de remeter os autos diretamente ao Tribunal ad quem, sem a possibilidade de realização do exame de admissibilidade pelo juízo originário, devolvendo ao Tribunal superior a rediscussão de toda a matéria objeto da controvérsia. Contudo, insta salientar, novamente, que matérias fáticas jamais poderão vir a ser analisadas pelos Tribunais Superiores, conforme entendimento já sumulado.

            Assim dispõe o comando legal, insculpido no art. 544: ?não admitido o recurso extraordinário ou o recurso especial, caberá agravo nos próprios autos, no prazo de 10 (dez) dias?.

            Uma vez recebido o Agravo, será intimada a parte agravada para exercer o direito à ampla defesa e ao contraditório, apresentando contrarrazões ao Agravo no prazo máximo e improrrogável de dez dias. Uma vez superada esta etapa, os autos deverão, compulsoriamente, ser remetidos ao Tribunal Superior, de acordo com o §2º do art. 544 do diploma processual vigente, verbis:

§ 2o A petição de agravo será dirigida à presidência do tribunal de origem, não dependendo do pagamento de custas e despesas postais. O agravado será intimado, de imediato, para no prazo de 10 (dez) dias oferecer resposta, podendo instruí-la com cópias das peças que entender conveniente. Em seguida, subirá o agravo ao tribunal superior, onde será processado na forma regimental.

 

Em outras palavras, o Tribunal de origem jamais poderá negar seguimento ao Recurso Especial quando da interposição do aludido Agravo, haja vista esta manobra processual ter o único e exclusivo objetivo de realizar o destrancamento do Recurso Especial, alçando ele para fora da competência das vias ordinárias.

            Este, inclusive, é o entendimento pacífico do próprio Superior Tribunal de Justiça, exemplificado pelo julgado apresentado abaixo.

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO QUE NEGA SEGUIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO DE INSTRUMENTO INTEMPESTIVO.
1. O agravo de instrumento é o único recurso cabível contra decisão que nega seguimento a recurso especial. Desse modo, a oposição de embargos de declaração não interrompe o prazo para a interposição de agravo de instrumento.[4]

            Uma vez que o Agravo devolverá, invariavelmente, a discussão da matéria ao Tribunal ad quem, caberá ao ministro relator, com base no art. 544, §4º:

a) não conhecer do agravo manifestamente inadmissível ou que não tenha atacado especificamente os fundamentos da decisão agravada;

b) conhecer do agravo para negar-lhe provimento, se correta a decisão que não admitiu o recurso, negar seguimento ao recurso manifestamente inadmissível, prejudicado ou em confronto com súmula ou jurisprudência dominante no tribunal ou, por fim, dar provimento ao recurso, se o acórdão recorrido estiver em confronto com súmula ou jurisprudência dominante no Tribunal.      

 

            Assim sendo, o manejo do Agravo contra decisão que denega, monocraticamente, seguimento ao Recurso Especial parece, em uma breve análise, uma poderosa ferramenta a ser utilizada pelas partes a fim de garantir o respeito aos princípios constitucionais que regem o processo, notadamente no que tange ao princípio do duplo grau de jurisdição.

            Contudo, ao ser analisada a possibilidade do manejo do Agravo contido no art. 544 do Código de Processo Civil à luz da alteração legislativa ocorrida por ocasião da promulgação da lei de recursos repetitivos, verificar-se-á a total incompatibilidade entre os dois institutos.

            Isto porque, a alteração promovida pela lei dos Recursos Repetitivos visa, dentre outras coisas, a efetivação da celeridade processual, direito fundamental garantido pela Constituição Federativa do Brasil. Tanto que para isso, ela permite que, uma vez consolidado entendimento acerca das controvérsias que permeiam o mérito dos Recursos Repetitivos, estes devem ter seu seguimento liminarmente negado, quando forem manifestamente contrários ao posicionamento do Superior Tribunal de Justiça.

            Ocorre que, como mencionado acima, sempre que o Tribunal de Origem não conhecer do Recurso Especial, lhe negando seguimento, a parte prejudicada agravar desta decisão, remetendo os autos diretamente ao Superior Tribunal de Justiça, relegando ao Tribunal Superior toda a rediscussão da matéria.

            Portanto, verifica-se que a Lei n. 11.672/2008 foi elaborada com o intuito de garantir que certos Recursos Especiais não cheguem à apreciação do Superior Tribunal de Justiça, quando estiverem em plena contrariedade com o entendimento exarado pela Corte Superior.

            Por outro lado, o Agravo insculpido no art. 544 garante a todos os jurisdicionados a faculdade de alçar sua discussão até o Superior Tribunal de Justiça, a fim de que o processo seja novamente analisado e, possivelmente, alterado em determinado aspecto.

            Concluindo, caso o Agravo do art. 544 possuísse a força processual necessária para elevar à competência do Superior Tribunal de Justiça todos aqueles processos cujo seguimento for denegado com base no §7º do art. 543-C, estar-se-ia desvirtuando a Lei 11.672/2008, em uma clara afronta aos principais motivos fundadores da aludida legislação.

            Assim, com o plano de fundo completamente exposto e devidamente explicado, adentra-se no mérito do aparente conflito de normas processuais, conforme entendimento recente apresentado pelo Superior Tribunal de Justiça.

 4) O aparente conflito de normas

 

            Insta iniciar a presente discussão trazendo à baila trecho de um julgado recentemente enfrentado pelo Superior Tribunal de Justiça, por ocasião da Questão de Ordem apresentada pelo Ministro César Asfor Rocha, em processo envolvendo o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária ? Incra e algumas empresas.

 

QUESTÃO DE ORDEM. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CABIMENTO. EXEGESE DOS ARTS. 543 E 544 DO CPC. AGRAVO NÃO CONHECIDO.

? Não cabe agravo de instrumento contra decisão que nega seguimento a recurso especial com base no art. 543, § 7º, inciso I, do CPC.[5]

 

A questão de ordem foi apresentada em razão da interposição de Recurso de Agravo contra decisão que negou seguimento ao Recurso Especial, alegando, dentre outras coisas, a usurpação de Competência realizada pelo Tribunal de origem, em razão de passar a análise do mérito da controvérsia, situação que, conforme entendimento do Agravante, restava totalmente inquinada de ilegalidades.

Em seu voto, o Ministro César Asfor Rocha apresentou entendimento no sentido de que as duas normas não se coadunam, não podendo existir ferramenta recursal contra decisão exarada com base na Lei 11.672/08.

Isso porque, conforme seu entendimento, aludida legislação foi criada em razão da explosão de processos que chegam ao conhecimento do Superior Tribunal de Justiça dia a dia, prejudicando por demais a qualidade da prestação jurisdicional estatal.

A fim de enfatizar ainda mais o entendimento apresentado, colaciona-se pequeno excerto do voto do Ministro Relator:

A edição da Lei n. 11.672, de 8.5.2008, decorreu, sabidamente, da explosão de processos repetidos junto ao Superior Tribunal de Justiça, ensejando centenas e, conforme a matéria, milhares de julgados idênticos, mesmo após a questão jurídica já estar pacificada.

O mecanismo criado no referido diploma, assim, foi a solução encontrada para afastar julgamentos meramente “burocráticos” nesta Corte, já que previsível o resultado desses diante da orientação firmada em leading case pelo órgão judicante competente.

Não se perca de vista que a redução de processos idênticos permite que o Superior Tribunal de Justiça se ocupe cada vez mais de questões novas, ainda não resolvidas, e relevantes para as partes e para o País. Assim, criado o mecanismo legal para acabar com inúmeros julgamentos desnecessários e inviabilizadores de atividade jurisdicional ágil e com qualidade, os objetivos da lei devem, então, ser seguidos também no momento de interpretação dos dispositivos por ela inseridos no Código de Processo Civil e a ela vinculados, sob pena de tornar o esforço legislativo totalmente inócuo e de eternizar a insatisfação das pessoas que buscam o Poder Judiciário com esperança de uma justiça rápida.[6]

 

Importante salientar, ainda, que com a edição da Lei 11.672/2008 o Superior Tribunal de Justiça conseguiu diminuir em aproximadamente 50% (cinqüenta por cento) os processos em trâmite no Tribunal da Cidadania.

Por essa razão, seria um disparate conceber que todo um trabalho realizado em favor da celeridade processual deveria ser excomungado do ordenamento jurídico em razão de pretensa afronta ao princípio da ampla defesa, que como se percebe, possuiria um caráter meramente protelatório em tais situações, em razão de que o julgamento seria realizado consoante solidificado entendimento, não havendo assim qualquer prejuízo para as parte litigantes.

Consagra ainda o entendimento de que ambas as normas foram criadas em momentos dispares do direito nacional, não devendo, sequer, existir a pretensão por parte dos operadores do direito de que referidas normais coexistam em um plano de harmonia e eficácia.

Isso porque, de acordo com o Superior Tribunal de Justiça, o Agravo constitui-se de ferramenta recursal apta a combater decisões que negam seguimento ao Recurso Especial, desde que fundadas em no prévio juízo de admissibilidade realizado pelo Tribunal de Origem, situação que não ocorre quando o Recurso não é conhecido por força do§7º do art. 543-C.

Ilustrando o exposto, segue na esteira mais um trecho do entendimento esposado por ocasião do julgamento da Questão de Ordem no Agravo de Instrumento n. 1.154.599:

 

Sob esse enfoque, a norma do art. 544 do Código de Processo Civil, editada em outro momento do Poder Judiciário, deve ser interpretada restritivamente, incidindo, apenas, nos casos para os quais o agravo de instrumento respectivo foi criado, ou seja, nas hipóteses em que o órgão judicante do Tribunal de origem tenha apreciado efetivamente os requisitos de admissibilidade do recurso especial.

O exame dos mencionados pressupostos recursais, sem dúvida, não alcança a norma do inciso I do § 7º do art. 543-C do Código de Processo Civil. Nesse dispositivo, o apelo extremo tem seguimento negado com base no julgamento do mérito de apelo que serviu de paradigma ou, como dispõe a própria lei, de “recurso representativo de controvérsia” (§ 1º do mesmo dispositivo). Antecipa-se, enfim, no eleito recurso repetitivo, o resultado dos futuros recursos que cuidarem de matéria idêntica.[7]

 

            Portanto, no entendimento solidificado do Superior Tribunal de Justiça, permitir a interposição de Agravo a situação em discussão ensejaria ?flagrantemente, a mera substituição de cores e de nomenclaturas dos recursos que subirão ao Superior Tribunal de Justiça?.[8]

            Assim, estar-se-ia tornando inócua a utilização da nova lei, haja vista que o acesso ao Judiciário e a prestação jurisdicional rápida e com qualidade restaria ameaçada, mantendo-se o permitindo a sobrevivência do calvário recursal que por anos aterrorizou as partes que ora desejaram apresentar seus problemas ao Poder Judiciário.

            Além da possibilidade do manejo do Agravo insculpido no art. 544 do Código de Processo Civil, o Superior Tribunal de Justiça enfrentou outra questão suscitada nos autos do Agravo de Instrumento, qual seja, a usurpação da Competência do Tribunal ad quem.

            Isso porque, conforme fundamentação do Agravante, o Tribunal de origem havia adentrado no mérito da demanda ao não permitir sua subida ao egrégio Superior Tribunal de Justiça, possibilidade garantida apenas a este último, por força do efeito devolutivo do Recurso Especial.

            Ocorre que, contrariamente ao requerido pelo Agravante, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento diverso daquele pretendido, decidindo pela possibilidade do Tribunal de Origem impedir a subida do Recurso Especial em total dissonância com entendimento esposado por ocasião de julgamento de Recurso Especial sob o regime de Recursos Repetitivos, conforme fundamentação encontrada no acórdão analisado.

A pergunta é: pode o Tribunal de origem, através do seu órgão competente, impedir a subida do agravo de instrumento aplicando a regra do art. 543-C do CPC? Penso que sim, anotando, desde logo, que tal decisão, obstando o prosseguimento do agravo, não representa, em princípio, usurpação da competência desta Corte. Isso por se tratar de recurso absolutamente incabível, não previsto em lei para a hipótese em debate e, portanto, não inserido na competência do Superior Tribunal de Justiça.

Da mesma forma, manter a possibilidade de subida do agravo para esta Corte implica viabilizar a eternização do feito, obstaculizando o trânsito em julgado da sentença ou acórdão e lotando novamente esta Corte de recursos inúteis e protelatórios, o que não se coaduna com o objetivo da Lei n. 11.672/2008.[9]

 

            Com base neste entendimento, o Tribunal da Cidadania relegou aos Tribunais cidadãos o dever de negar seguimento aos Recursos Especiais que estejam em dissonância com julgamentos proferidos, em sede de regime especial de Recursos Repetitivos, pela Corte Superior de Justiça.

            Desta forma, o egrégio STJ pretende garantir que certas discussões não se tornem um eterno jogo processual, fazendo com que a justiça não consiga atender os desígnios do seu povo com a presteza devida, estando sempre presa a grilhões legais, não possuindo a agilidade e rapidez que todos esperam dela.

            Assim, vencida mais uma etapa, analisa-se a última controvérsia abarcada na Questão de Ordem analisada, configurada pela seguinte pergunta: ?Poderá haver hipóteses em que, de fato, o recurso especial terá seguimento negado indevidamente, por equívoco do órgão julgador na origem?? [10]

            A resposta da pergunta acima é de fácil constatação. Sim, poderá haver situações em que o Recurso Especial terá seguimento negado indevidamente, porém, aplicando-se, analogicamente, entendimento semelhante exarado pelo Supremo Tribunal Federal, o Recurso eleito para combater decisão que, indevidamente, nega seguimento ao Recurso Especial deverá ser o Agravo Interno.

            Por fim, o Ministro César Asfor Rocha conclui sua fundamentação acerca da eleição do Agravo Interno como Recurso oponível as decisões denegatórias de REsp, ao argumento de que:

 

Observo que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Questão de Ordem no Agravo de Instrumento n. 760.358-7, decidiu de forma semelhante.

Considerando inadequada a utilização da reclamação para correção de equívocos na aplicação da jurisprudência daquele Tribunal aos processos sobrestados na origem pela repercussão geral, entendeu que o único instrumento possível a tal impugnação seria o agravo interno[11]

5) Conclusão

            Ante o exposto, o presente trabalho pretende, em uma análise jurisprudencial, verificar a possibilidade de convivência harmônica das normas insculpidas no art. 543-C e 544 do Código de Processo Civil.

            Isto porque, o art. 543-C do Códex Processual regulamenta o procedimento especial aos quais estão relegados os Recursos Especiais Repetitivos, tudo conforme exposto no item 2. Tais Recursos, quando manifestamente inadmissíveis devem ser barrados na origem, tendo seu seguimento negado pelo desembargador relator.

            Já o art. 544 do mesmo diploma legal prevê a figura do Agravo contra decisão que não admite a interposição de Recurso Especial ou Extraordinária, comumente utilizada pelos operadores do direito, a fim de ver seus Recursos Especiais e Extraordinários serem elevados aos Tribunais Superiores.

            Verifica-se, ainda, que ambas as normas estão plenamente vigentes no ordenamento jurídico pátrio, todavia, não devem se relacionar.

            Isso porque, o Agravo interposto contra decisão exarada em sede de Recurso Especial Repetitivo tem o condão de fulminar o espírito da Lei 11.672/2008, qual seja, impedir que Recursos desnecessários precisem ser julgados e analisados pelo Superior Tribunal de Justiça.

            Por essa razão, o egrégio STJ firmou entendimento no sentido de que as duas normas não se coadunam, razão pela qual o Agravo do art. 544 não é o recurso cabível contra decisão que nega seguimento ao Recurso Especial Repetitivo.

            Por fim, restou caracterizado no novo entendimento, adotado pelo STJ, que os Tribunais a quo poderão negar seguimento aos Recursos Especiais com fundamentação já analisada pelo STJ, por ocasião do julgamento da mesma matéria, desde que tal julgamento tenha sido feito à luz do art. 543-C do Código de Processo Civil.

            Assim, concluo ser completamente válido e constitucional o entendimento adotado pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, tendo em vista se tratar de mais uma arma contra a pungente morosidade que se alastra como uma praga por todos os Tribunais do nosso país.

            Temas como o presente, que procurem soluções para garantir aos cidadãos um judiciário mais seguro e célere, devem ser estudados e debatidos com freqüência, começando nas salas de aula das faculdades e findando somente nos corredores de nossos ilustres pretórios, afinal de contas, como já dizia o ilustríssimo Rui Barbosa ?a justiça tardia, em verdade, é uma injustiça?.

 

* Assessor Jurídico no Escritório de Advocacia Piazera, Hertel, Manske & Pacher Advogados Associados, inscrito na OAB/SC sob nº 1.029. Acadêmico de Direito, cursando a 10ª fase na Faculdade Metropolitana de Guaramirim ? Uniasselvi/FAMEG.



[1] Humberto THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil ? Volume 1 ? 50. Ed.. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 658.

[2] Humberto Theodoro Júnior ? Curso de Direito Processual Civil ? Volume 1 ? 50ª Edição ? Editora Forense ? Rio de Janeiro ? 2009 ? Pg. 658 SEGUIR AS MESMAS ORIENTAÇÕES DA CITAÇÃO ANTERIOR…

[3] Elpídio Donizete – Curso Didático de Direito Processual Civil ? 15ª Ed. Editora Atlas ? São Paulo ? 2011 ? Pg.767. Seguir orientações indicadas na citação anterio…

[4] Superior Tribunal de Justiça – Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n. 734465 ? Órgão Julgador: Quarta Turma ? Data do Julgamento: 07/04/2011.

[5] Questão de Ordem no Agravo de Instrumento nº 1.154.599 ? Órgão Julgador: Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça ? Data do Julgamento: 16/02/2011.

[6] Questão de Ordem no Agravo de Instrumento nº 1.154.599 ? Órgão Julgador: Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça ? Data do Julgamento: 16/02/2011.

[7] Questão de Ordem no Agravo de Instrumento nº 1.154.599 ? Órgão Julgador: Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça ? Data do Julgamento: 16/02/2011.

[8] Idem 9.

[9] Questão de Ordem no Agravo de Instrumento nº 1.154.599 ? Órgão Julgador: Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça ? Data do Julgamento: 16/02/2011.

[10]  Idem 9

[11] Ibidem

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