Josiane Pretti[1]
RESUMO:
Com efeito, muitas empresas estão buscando judicialmente, bem como, liminarmente, assegurar o acesso ao parcelamento ordinário previsto na Lei nº 10.522/2002, e ainda, o direito de se manter no Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições (Simples Nacional). No entanto, a Receita Federal do Brasil tem vedado o acesso das micro e pequenas empresas enquadradas no Regime de Apuração do Simples Nacional, ao parcelamento ordinário instituído pela Lei nº 10.522/02, sem que para tanto exista previsão legal expressa. São raras as notícias de decisões quanto a possibilidade de assegurar a inclusão de débitos alusivos ao Simples Nacional, no parcelamento ordinário instituído pela Lei nº 10.522/02, mas não é impossível tal provimento, tudo depende do entendimento de cada magistrado.
Palavras ? chaves: Simples Nacional, parcelamento, Lei nº 10.522/02.
1 ? INTRODUÇÃO
Muitas empresas no exercício regular de suas atividades, acabam acumulando débitos referente ao Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte, ou seja, Simples Nacional ? regulado pela Lei Complementar nº 123/06.
Consequentemente, os administradores procuram a Receita Federal do Brasil, afim de parcelar os débitos, no entanto, esta pretensão é negada por parte da instituição, que entendem que os débitos do Simples Nacional não são passíveis de nenhum tipo de parcelamento.
Ainda, procedimento comum é a exclusão da empresa devedora do Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições (Simples Nacional), por meio de Ato Declaratório Executivo, pelo qual, determina a data que a exclusão passa a ter efeitos.
Assim, a empresa fica obrigada no próximo exercício a optar por outro regime de tributação, pois, a opção pelo Simples Nacional será negada, devido as pendências apontadas.
Com efeito, muitas empresas estão buscando judicialmente, bem como, liminarmente, assegurar o acesso ao parcelamento ordinário previsto na Lei nº 10.522/2002, e ainda, o direito de se manter no Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições (Simples Nacional).
2 ? DO PARCELAMENTO ORDINÁRIO ? LEI Nº 10522/2002
O parcelamento ordinário encontra previsão legal na Lei Ordinária nº 10.522/02, e suas alterações, sendo expressa ao assegurar aos contribuintes o benefício fiscal nos seguintes termos:
Art. 10. Os débitos de qualquer natureza para com a Fazenda Nacional poderão ser parcelados em até sessenta parcelas mensais, a exclusivo critério da autoridade fazendária, na forma e condições previstas nesta Lei.
[…]
No entanto, a Receita Federal do Brasil tem vedado o acesso das micro e pequenas empresas enquadradas no Regime de Apuração do Simples Nacional, ao parcelamento ordinário instituído pela Lei nº 10.522/02, sem que para tanto exista previsão legal expressa.
O mesmo diploma legal, em seu artigo 14, estabelece de forma expressa as vedações para a concessão do parcelamento em questão, sem fazer qualquer menção ao SIMPLES NACIONAL, regido pela Lei Complementar nº 123/06, ou sequer ao regime simplificado anterior (SIMPLES), a saber:
Art. 14. É vedada a concessão de parcelamento de débitos relativos a:
I ? tributos passíveis de retenção na fonte, de desconto de terceiros ou de sub-rogação;
II – Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguro e sobre Operações relativas a Títulos e Valores Mobiliários ? IOF, retido e não recolhido ao Tesouro Nacional;
III – valores recebidos pelos agentes arrecadadores não recolhidos aos cofres públicos.
IV ? tributos devidos no registro da Declaração de Importação;
V ? incentivos fiscais devidos ao Fundo de Investimento do Nordeste ? FINOR, Fundo de Investimento da Amazônia ? FINAM e Fundo de Recuperação do Estado do Espírito Santo ? FUNRES;
VI ? pagamento mensal por estimativa do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica ? IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido ? CSLL, na forma do art. 2o da Lei no 9.430, de 27 de dezembro de 1996;
VII ? recolhimento mensal obrigatório da pessoa física relativo a rendimentos de que trata o art. 8o da Lei no 7.713, de 22 de dezembro de 1988;
VIII ? tributo ou outra exação qualquer, enquanto não integralmente pago parcelamento anterior relativo ao mesmo tributo ou exação, salvo nas hipóteses previstas no art. 14-A desta Lei;
IX ? tributos devidos por pessoa jurídica com falência decretada ou por pessoa física com insolvência civil decretada; e
X ? créditos tributários devidos na forma do art. 4o da Lei no 10.931, de 2 de agosto de 2004, pela incorporadora optante do Regime Especial Tributário do Patrimônio de Afetação.
Assim, diante da inexistência de previsão legal específica que impossibilita o direito a inclusão dos débitos alusivos ao Simples Nacional no parcelamento ordinário, o deferimento da pretensão é medida que se impõe, até mesmo, em homenagem aos princípios constitucionais que asseguram às micro e pequenas empresas um tratamento diferenciado:
ART. 179. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempresas e empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei.”
Nesse sentido, vedar o acesso ao parcelamento ordinário, implica em contrariar os comandos constitucionais indicados, haja vista que contribuintes de melhor estruturados economicamente (empresas de médio e grande parte ? enquadradas no lucro real, presumido e até mesmo arbitrado), poderão fazer uso do parcelamento ordinário, enquanto as micro e pequenas empresas serão estarão impedidas.
Dessa forma, as empresas que buscam o judiciário afim de um provimento judicial que lhe assegure o direito ao benefício fiscal instituído pela Lei nº 10.522/02, devem requerer liminarmente, além do direito de parcelar seus débitos alusivos ao Simples Nacional em 60 meses, o direito de permanecer no Simples Nacional, ou seja, optar pelo Simples Nacional para a tributação do próximo exercício.
A medida heróica, faz-se necessária, vez que, a empresa estará obrigada a optar por outra modalidade de tributação, que com certeza, será menos vantajosa para o porte da empresa e de seu faturamento.
Pelo exposto, vale destacar, que é crescente o número de notícias de decisões em caráter liminar, de empresas que pretendem o parcelamento de seus débitos referentes ao Simples Nacional, no parcelamento ordinário instituído pela Lei nº 10.522/02.
3 ? DOS PRECEDENTES
Diante do exposto, vale destacar a recente sentença proferida no Mandado de Segurança nº 5002571-62.2010.404.7208, pelo Juiz Federal Substituto Dr. Nelson Gustavo Mesquita Ribeiro Alves, da 2º Vara Federal da Comarca de Itajaí/SC:
SENTENÇA
1. RELATÓRIO
Trata-se de mandado de segurança, no qual a impetrante busca provimento jurisdicional, inclusive liminarmente, para que lhe seja autorizado o parcelamento ordinário relativamente aos créditos oriundos do Simples Nacional, referentes aos exercícios de 2007 a 2010, com base na Lei Federal 10.522/02, a fim de lhe assegurar a permanência no referido regime.
Inicial e documentos no evento 1.
Foi postergada a apreciação da liminar (evento 3).
Notificada, a autoridade coatora prestou informações (evento 10), defendendo [a] a incompatibilidade do parcelamento ordinário para débitos referentes ao Simples Nacional, e [b] o não preenchimento dos requisitos necessários para a concessão da liminar.
Liminar indeferida (evento 15).
O MPF justificou a sua não intervenção (evento 26).
É o relatório. Decido.
2. FUNDAMENTAÇÃO
Apesar da decisão liminar, refletindo sobre o tema posto neste mandado de segurança, penso que deve ser reconhecido o acerto da tese defendida na inicial, conforme passo a explicar.
No caso dos autos, a celeuma gira em torno da possibilidade de permitir à impetrante o parcelamento ordinário de débitos a referentes ao Simples Nacional e consequente permanência neste regime tributário.
Nesta esteira, dispõe o art. 10 da Lei n° 10.522/2002:
‘Art. 10. Os débitos de qualquer natureza para com a Fazenda Nacional poderão ser parcelados em até sessenta parcelas mensais, a exclusivo critério da autoridade fazendária, na forma e condições previstas nesta Lei.
Já a LC 123/2006, que institui o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, preconiza em seu art. 1°:
Art. 1º Esta Lei Complementar estabelece normas gerais relativas ao tratamento diferenciado e favorecido a ser dispensado às microempresas e empresas de pequeno porte no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, especialmente no que se refere:
I – à apuração e recolhimento dos impostos e contribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, mediante regime único de arrecadação, inclusive obrigações acessórias;
Como se vê, a lei ordinária não faz qualquer restrição aos tributos que compõem o Simples Nacional, até porque promulgada anteriormente à lei complementar. Não bastasse isso, interpretar a norma ordinária restritivamente implicaria ferir os comandos constitucionais que garantem tratamento privilegiado às microempresas e empresas de pequeno porte.
Com efeito, a situação das microempresas e empresas de pequeno porte tem encontrado espaço no Texto Constitucional desde a sua redação original de 05.10.1988, o que demonstra a preocupação da Assembléia Constituinte com a realidade econômica de nosso País, que ostenta no seu mercado um grande número de sociedades empresárias de porte reduzido, a merecer, portanto, preocupação do documento máximo da Nação.
Neste diapasão, já previa o art. 179 da Lei Maior que:
Art. 179. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei.
Também o art. 170, IX, ainda na redação original do Texto Constitucional de 1988, previa como um dos princípios da ordem econômica o ‘tratamento favorecido para as empresas brasileiras de capital nacional de pequeno porte’.
Além disso, duas alterações constitucionais também tiveram como assunto as microempresas e as empresas de pequeno porte.
A primeira foi trazida pela Emenda Constitucional nº 6, de 15.08.1995, que alterou a redação do artigo antes reproduzido, passando a prever como um dos princípios da ordem econômica o ‘tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País’.
Já no ano de 2003 veio a segunda alteração, com a inclusão na Constituição Federal do art. 146, III, ‘d’, através da Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003, que previu como norma geral em matéria de legislação tributária a ‘definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados no caso do imposto previsto no art. 155, II, das contribuições previstas no art. 195, I e §§ 12 e 13, e da contribuição a que se refere o art. 239’.
De todos estes excertos constitucionais, percebe-se claramente que a Constituição Federal de 1988 procurou privilegiar as microempresas e as empresas de pequeno porte, dispensando-as tratamento diferenciado e favorecido e relação às demais sociedades empresárias de médio e grande porte, a fim de que aquelas pudessem sobreviver e se desenvolver na economia de mercado que vivencia o País.
Toda a interpretação de normas deve ser feita à luz da Constituição Federal de 1988, bem como da natureza jurídica das figuras de direito envolvidas, razão porque a interpretação restritiva da Lei n° 10.522/2002 não pode ser admitida.
Destaca-se, por fim, que a vedação em razão da abrangência de tributos estaduais e municipais no Simples Nacional não se justifica, pois, do contrário, a LC 123 seria inconstitucional por ter a União legislado sobre tributos de tais entes. Ademais, em caso de inadimplência, quem executa é a União (inclusive tributos estaduais/municipais).
3. DISPOSITIVO
Ante o exposto, concedo a segurança para determinar que a autoridade coatora assegure à impetrante o direito de manutenção no regime tributário do Simples Nacional, bem como autorize o parcelamento instituído pela Lei n° 10.522/2002 (60 vezes), em relação aos débitos apurados na forma do Simples.
Ciência à autoridade coatora.
Honorários advocatícios incabíveis à espécie (Súmulas 512 do Supremo Tribunal Federal e 105 do Superior Tribunal de Justiça).
Custas na forma da lei.
Sentença sujeita a reexame necessário.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Eventual recurso interposto será recebido apenas no efeito devolutivo, valendo o presente como recebimento do mesmo em caso de preenchimento dos pressupostos de admissibilidade. Preenchidos estes, dê-se vista à parte contrária para apresentação de contra-razões, com posterior remessa ao TRF da 4ª Região.
Itajaí, 16 de dezembro de 2010.
Nelson Gustavo Mesquita Ribeiro Alves
Juiz Federal Substituto
4 ? CONCLUSÃO
Contudo, o entendimento da Receita Federal do Brasil, bem como a Procuradoria da Fazenda Nacional, é de não permitir que sejam parceladas dívidas relativas ao Simples Nacional, posto que, o argumento sustentado por estes órgãos é de que, como o Simples Nacional abrange tributos de diversas esferas da federação (União, Estados e Municípios), a Receita Federal do Brasil, e ato contínuo, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional ? não poderiam parcelar dívidas concernentes a impostos que não são de sua competência.
Sendo assim, são raras as notícias de decisões quanto a possibilidade de assegurar a inclusão de débitos alusivos ao Simples Nacional, no parcelamento ordinário instituído pela Lei nº 10.522/02, mas não é impossível tal provimento, tudo depende do entendimento de cada magistrado.
Portanto, pode se dizer que é uma questão de tempo, a discussão é nova, sem muitos precedentes, mas com fundamentos sólidos no direito!
5 ? BIBLIOGRAFIA
LEI Nº 10.522/2002.
[1] Graduada em Direito pela Unerj; Estudante de Pós graduação em Direito Tributário pela Instituição Luiz Flávio Gomes e advogada do escritório Piazera, Hertel, Manske & Pacher Advogados Associados
E-mail: josiane@phmp.com.br
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