Denise Bartel Bortolini[1]

 

RESUMO

 

Este artigo tem por objetivo o estudo da obrigação alimentar dos avós e demais ascendentes, quando da impossibilidade de um dos genitores em prestar essa obrigação; seja pelo motivo de não dispor de recursos econômicos, pela incapacidade, morte ou por qualquer outro motivo.

 

Palavras-chave: Alimentos. Avós. Alimentos Avoengos. Obrigação Residual/Subsidiária.

 

 

1.  INTRODUÇÃO

 

A obrigação alimentar face o menor está amplamente protegida pelo nosso ordenamento jurídico.

Dessa proteção, inclusive, pode-se destacar previsão constitucional, mais precisamente o artigo 229 da Constituição Federal, bem como, uma série de artigos dispostos no Código Civil.

Interessante se faz esta análise, pois o ordenamento jurídico, com o intuito da proteção do menor, previu não somente a obrigatoriedade dos alimentos ao menor por parte dos pais como também fez previsão expressa da obrigatoriedade dos ascendentes quando da impossibilidade do sustento pelos genitores.

 

 

2. DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR AVOENGA

 

A Constituição Federal, em seu artigo 229, deixou claro que aos pais cabe o dever de sustentar os filhos menores, conforme segue: ?Os pais têm o dever de assistir, criar, educar os fihos menores (…).?.

O Código Civil disciplina a matéria dos alimentos, e em seu artigo 1.696, disciplina taxativamente o seguinte:

 

Art. 1.696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns na falta dos outros.

 

A obrigação é estabelecida entre pais e filhos, cabendo a ambos os genitores a obrigação do sustento dos filhos.

Na indisponibilidade de um genitor em atender essa obrigação, independente do motivo, a mesma recai sobre o outro genitor.

E como fica a situação dos menores que não possuem genitores com condições de prover-lhes o sustento?

A pessoa que não possui condições de se sustentar e nenhum dos genitores em prestar-lhe o auxílio necessário, poderá pleitear alimentos aos ascendentes (avós, bisavós e assim por diante), desde que este auxílio não afete o próprio sustento do ascendente.

Mesmo a Constituição Federal estabelecendo em seu artigo 229 que o dever dos alimentos cabe aos pais, a obrigação alimentar por parte dos ascendentes encontra suporte no artigo 1.694 do Código Civil, atraves do dever da solidariedade familiar, assim dispondo:

 

Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.

 

Mas esta solidariedade familiar só encontra suporte quando efetivamente os genitores não possam atender as necessidades dos filhos, conforme prevê o artigo 1.698 do Código Civil, com a seguinte redação:

 

Art. 1.698. Se o parente, que deve alimentos em primeiro lugar, não estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados a concorrer os de grau imediato; sendo várias as pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos, e, intentada ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide.

 

A obrigação aos avós de prestar alimentos aos netos é uma obrigação residual/subsidiária, visto que o dever da solidariedade familiar imposta cabe primeiramente aos pais, sejam ambos ou um na falta do outro.

Desta forma, a exigência da prestação de alimentos pelos avós, bisavós e assim por diante (sempre respeitando a ordem do ascendente mais próximo), só é viável quando da impossibilidade do ascendente da classe mais próxima em prestar alimentos e estes serem necessários ao menor, e, quando este sustento por parte do ascendente não dificulte sua própria sobrevivência.

Tanto é que, o artigo 1.695 do Código Civil assim prevê:

 

Art. 1695. São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento.

 

Se os alimentos forem então prestados pelos ascendentes, tem-se os denominados alimentos avoengos.

 

 

3. DA DOUTRINA E DA JURISPRUDÊNCIA FACE OS ALIMENTOS AVOENGOS

 

A obrigação alimentar não é apenas repassada para os avós, ou a qualquer outro ascendente por livre escolha.

Oportuno neste momento o ensinamento de Yussef Said Cahali quanto a ordem para prestar alimentos:

 

Assim, suas circunstâncias abrem oportunidade para a convocação do ascendente mais remoto à prestação alimentícia: a falta de ascendente em grau mais próximo ou a falta de condição econômica deste para fazê-lo; o grau mais próximo exclui aquele mais remoto, sendo o primeiro lugar na escala dos obrigados ocupado pelos genitores; apenas se faltam os genitores, ou se estes se encontram impossibilitados financeiramente de fazê-los, estende-se a obrigação de alimentos aos ulteriores ascendentes, respeitada a ordem de proximidade. (Dos Alimentos. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p. 702/703)

 

Primeiramente deve-se esgotar todas as possibilidades da prestação alimentar por parte dos genitores.

Todos os meios processuais disponíveis para requerer o pagamento da pensão alimentícia devem ser exercidos. O mero inadimplemento do pagamento por parte do genitor não caracteriza a impossibilidade de prestar alimentos.

Inclusive a esse respeito, tem-se o a negação do provimento ao recurso Resp 1.211.314-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi,julgado em 15/09/2011, conforme segue:

 

RECURSO ESPECIAL Nº 1.211.314 – SP (2010/0163709-4)

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI

RECORRENTE : J O A B E OUTROS

REPR. POR : K C O G DO E S

ADVOGADO : FÁBIO SANTOS DA SILVA

RECORRIDO : I P B

ADVOGADO : TATIANA MATHIAS

EMENTA

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. OBRIGAÇÃO ALIMENTAR AVOENGA. PRESSUPOSTOS. POSSIBILIDADES DO ALIMENTANTE. ÔNUS DA PROVA.

1. Apenas na impossibilidade de os genitores prestarem alimentos, serão os parentes mais remotos demandados, estendendo-se a obrigação alimentar, na hipótese, para os ascendentes mais próximos.

2. O desemprego do alimentante primário ? genitor ? ou sua falta confirmam o desamparo do alimentado e a necessidade de socorro ao ascendente de grau imediato, fatos que autorizam o ajuizamento da ação de alimentos diretamente contra este.

3. O mero inadimplemento da obrigação alimentar, por parte do genitor, sem que se demonstre sua impossibilidade de prestar os alimentos, não faculta ao alimentado pleitear alimentos diretamente aos avós.

4. Na hipótese, exige-se o prévio esgotamento dos meios processuais disponíveis para obrigar o alimentante primário a cumprir sua obrigação, inclusive com o uso da coação extrema preconizada no art. 733 do CPC.

5. Fixado pelo Tribunal de origem que a avó demonstrou, em contestação, a impossibilidade de prestar os alimentos subsidiariamente, inviável o recurso especial, no particular, pelo óbice da Súmula 7/STJ.

6. Recurso não provido.

 

E mais, da mesma forma que o menor está amparado pela legislação, o idoso também está. Nessa situação o critério da possibilidade deve prevalecer sobre o da necessidade, devendo os ascendentes serem respeitados face o princípio da dignidade.

Necessária se faz a comprovação que a obrigação alimentar que venha a recair ao ascendente, não faça com que este fique sem condições de se sustentar, ou seja, tem que ser feita uma análise concreta, caso a caso.

O que pode ocorrer é que seja determinado que aos genitores  recaia o pagamento da responsabilidade principal, recaindo aos ascendentes apenas a diferença do valor na manutenção do menor.

Carlos Roberto Gonçalves expõe que:

 

A ação deve ser dirigida primeiramente contra o pai, para, na impossibilidade dele, serem chamados os avós. Não se exclui a possibilidade de a ação ser proposta contra o pai e o avô, se evidenciado que aquele não tem condições de arcar sozinho com a obrigação alimentar. Os avós são, assim, chamados a complementar a pensão, que o pai, sozinho, não pode oferecer aos filhos (CC, art. 1.698). A doutrina é tranquila no sentido da admissibilidade do pedido de complementação. (Direito civil brasileiro, volume VI : direito de família. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 483)

 

Incluse a esse respeito, tem-se a seguinte decisão:

 

RECURSO ESPECIAL Nº 958.513 – SP (2007/0129470-0)

RELATOR : MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR

RECORRENTE : W A J E OUTRO

ADVOGADO : JOAQUIM SADDI E OUTRO(S)

RECORRIDO : N P J (MENOR) E OUTROS

REPR. POR : F N P J

ADVOGADO:OSVALDO JANUÁRIO BENGUELA JUNIOR E OUTRO(S)

EMENTA

CIVIL E PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL. FAMÍLIA. ALIMENTOS. INSUFICIÊNCIA DOS ALIMENTOS PRESTADOS PELO GENITOR. COMPLEMENTAÇÃO. AVÓS PATERNOS DEMANDADOS. PEDIDO DE LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO ENTRE AVÓS PATERNOS E MATERNOS. CABIMENTO, NOS TERMOS DO ART. 1.698 DO NOVO CÓDIGO CIVIL. PRECEDENTES.

I. Nos termos da mais recente jurisprudência do STJ, à luz do Novo Código Civil, há litisconsórcio necessário entre os avós paternos e maternos na ação de alimentos complementares. Precedentes.

II. Recurso especial provido. (grifo próprio)

 

E se o ascendente faltar no pagamento dos alimentos, cabe a prisão civil?

Seguindo o entendimento do Tribunal de São Paulo, tem o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, a respeito da prisão civil, decidido o seguinte:

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. RITO DO ART. 733 DO CPC. OBRIGAÇÃO AVOENGA. SUPOSTOS PROBLEMAS DE SAÚDE. JUSTIFICATIVA INSUBSISTENTE A AFASTAR O DECRETO PRISIONAL. A alegação de impossibilidade de pagamento da verba alimentar, em razão da idade avançada e dos problemas de saúde apresentados pelo devedor, avô da criança, bem assim a situação financeira precária, não o exime da obrigação já vencida, nem elide o decreto prisional. Ademais, consoante reiterado entendimento jurisprudencial, não há falar na discussão do binômio possibilidade/necessidade em sede de execução. Precedentes desta Corte e do Egrégio STJ. PRISÃO CIVIL. CUMPRIMENTO EM REGIME ABERTO. A prisão civil decorrente de dívida alimentar deve ser cumprida em regime aberto. Recomendação da Circular nº 21/93 da Corregedoria-Geral da Justiça e precedentes desta Câmara. Agravo de instrumento parcialmente provido, de plano. (Agravo de Instrumento Nº 70036826733, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luís Dall’Agnol, Julgado em 10/11/2010) (grifo próprio)

Diante do julgado, tem-se demonstrado que o não pagamento da prestação alimentar avoenga, embora seja uma prestação residual/subsidiária, não constitui obstáculo a execução do rito previsto no artigo 333 do Código de Processo Civil.

 

 

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

                       

Ao menor tem-se a obrigação alimentar por parte dos genitores. Porém, como é sabido, há situações em que os genitores se encontram impossibilitados com o cumprimento dessa obrigação.

O nosso ordenamento jurídico, ao abraçar o menor, não deixou de fora essa situação, determinando que, na impossibilidade do genitor arcar com a obrigação alimentar, seja por não dispor de recursos financeiros, seja em decorrência de sua incapacidade ou morte, enfim, independentemente do motivo, caberá aos ascendentes está obrigação.

Obrigação esta residual/subsidiária e denominada de obrigação alimentar avoenga.

E por fim, unânime está a doutrina e a jurisprudência no tocante que ao menor somente caberá alimentos avoengos, após esgotados todos os meios de cobrança de alimentos aos genitores.



[1]  Assessora Jurídica do Escritório de Advocacia Piazera, Hertel, Manske & Pacher Advogados Associados (OAB/SC 1.029). Bacharel em Direito pelo Centro Universitário de Jaraguá do Sul ? UNERJ.

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