Maristela Hertel[1]

RESUMO

 

Com a intenção de destacar os aspectos mais relevantes do tema TESTAMENTO VITAL é que se desenvolveu o presente artigo, em que se objetivou, num primeiro momento, a análise geral acerca do instituto do testamento, seus efeitos e reconhecimento judicial para, depois, com base na Resolução do Conselho Federal de Medicina, identificar o alcance do reconhecimento da validade jurídica das disposições testamentárias contidas no referido instrumento.

INTRODUÇÃO

 

A morte de uma pessoa traz vários efeitos jurídicos, entre eles o patrimonial, o familiar, previdenciário, trazendo em si uma carga de emoções e afeto entre os que convivem com o finado de forma a que os mesmos muitas vezes queiram garantir ou prolongar o máximo possível a vida do ente querido, submetendo-o a tratamentos, cirurgias, exames, muitas vezes sem perspectivas de cura ou de melhora.

 

Assim, o período prévio à morte tem sido cada vez mais estudado e traduzido em ações com base também em garantias fundamentais constitucionais como o da dignidade da pessoa humana e do princípio do direito à própria vida, de forma a que, a vontade do indivíduo seja observada não só após a sua morte, como faz o testamento, mas, também, no período que antecedem este evento.

 

O Conselho Federal de Medicina aprovou recentemente Resolução Federal destinada a consagrar a autonomia do paciente, autorizando médico a dar ao paciente o poder de escolher como deseja ser tratado no limite da sua vida, evitando tratamentos desnecessários em um quadro terminal.

Este documento tem por finalidade a defesa dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana (art.1º, III, CF e da dignidade da pessoa humana, artigo 5º, III, CF) de forma a reconhecer o direito à vida com dignidade, desobrigando-a a submeter-se a tratamentos indesejáveis e inúteis.

 

 

  1. DO TESTAMENTO

Testamento é ato jurídico personalíssimo, por meio do qual uma pessoa pode dispor, da totalidade dos seus bens, ou de parte deles, para depois da sua morte, podendo, ainda, nele registrar disposições de caráter não patrimonial.

 

O direito brasileiro reconhece o testamento como sendo um ato jurídico de declaração de última vontade, previsto no Código Civil, a partir do artigo 1.857.

 

São, portanto, admitidas as disposições extrapatrimoniais de caráter pessoal e familiar, que podem vir juntamente com as patrimoniais sob a fórmula de cláusula, ou esgotar inteiramente a declaração do testador, hipótese em que o testamento terá apenas essa finalidade. (Maria Helena Diniz, Curso de Direito Civil, volume 6. São Paulo: Saraiva, p.175)

 

Já o testamento vital teve seu reconhecimento na legislação administrativa, junto ao Conselho Federal de Medicina, na qual impôs aos médicos o dever de respeitar as diretivas antecipadas de pacientes que se encontrem sem capacidade de comunicação ou de expressão livre e independente. Essas diretivas são definidas como um conjunto de desejos, prévia e expressamente manifestados, sobre cuidados e tratamentos que o paciente quer ou não receber no momento em que estiver incapacitado do exercício livre e autônomo de sua vontade. (in http://portal.cfm.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=23215:a-ultima-licao-teologica-de-carlo-maria-martini-e-o-conselho-federal-de-medicina&catid=46:artigos&Itemid=18)

 

Desta forma, pode-se conceituar o testament vital como sendo:

 

O testamento vital é um documento, redigido por uma pessoa no pleno gozo de suas faculdades mentais, com o objetivo de dispor acerca dos tratamentos e não tratamentos a que deseja se submetida quando estiver diante de um diagnóstico de doença terminal e impossibilitado de manifestar sua vontade. É importante que este documento seja redigido com a ajuda de um médico de confiança do paciente. Ademais, ressalte-se que as disposições, para serem válidas no Brasil apenas podem versar sobre interrupção ou suspensão de tratamentos extraordinários, que visam apenas prolongar a vida do paciente. Tratamentos tidos como cuidados paliativos, cujo objetivo é melhorar a qualidade de vida do paciente não podem ser recusados. (in www.testamento vital.com.br; acesso em 29.09.2012)

 

O conteúdo da Resolução do Conselho Federal de Medicina, nº 1.995 de 2012, tem o seguinte conteúdo:

 

RESOLUÇÃO CFM nº 1.995/2012

(Publicada no D.O.U. de 31 de agosto de 2012, Seção I, p.269-70)

Dispõe sobre as diretivas antecipadas de vontade dos pacientes.

O CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, no uso das atribuições conferidas pela Lei nº 3.268, de 30 de setembro de 1957, regulamentada pelo Decreto nº 44.045, de 19 de julho de 1958, e pela Lei nº 11.000, de 15 de dezembro de 2004, e

CONSIDERANDO a necessidade, bem como a inexistência de regulamentação sobre diretivas antecipadas de vontade do paciente no contexto da ética médica brasileira;

CONSIDERANDO a necessidade de disciplinar a conduta do médico em face das mesmas;

CONSIDERANDO a atual relevância da questão da autonomia do paciente no contexto da relação médico-paciente, bem como sua interface com as diretivas antecipadas de vontade;

CONSIDERANDO que, na prática profissional, os médicos podem defrontar-se com esta situação de ordem ética ainda não prevista nos atuais dispositivos éticos nacionais;

CONSIDERANDO que os novos recursos tecnológicos permitem a adoção de medidas desproporcionais que prolongam o sofrimento do paciente em estado terminal, sem trazer benefícios, e que essas medidas podem ter sido antecipadamente rejeitadas pelo mesmo;

CONSIDERANDO o decidido em reunião plenária de 9 de agosto de 2012,

RESOLVE:

Art. 1º Definir diretivas antecipadas de vontade como o conjunto de desejos, prévia e expressamente manifestados pelo paciente, sobre cuidados e tratamentos que quer, ou não, receber no momento em que estiver incapacitado de expressar, livre e autonomamente, sua vontade.

Art. 2º Nas decisões sobre cuidados e tratamentos de pacientes que se encontram incapazes de comunicar-se, ou de expressar de maneira livre e independente suas vontades, o médico levará em consideração suas diretivas antecipadas de vontade.

§ 1º Caso o paciente tenha designado um representante para tal fim, suas informações serão levadas em consideração pelo médico.

§ 2º O médico deixará de levar em consideração as diretivas antecipadas de vontade do paciente ou representante que, em sua análise, estiverem em desacordo com os preceitos ditados pelo Código de Ética Médica.

§ 3º As diretivas antecipadas do paciente prevalecerão sobre qualquer outro parecer não médico, inclusive sobre os desejos dos familiares.

§ 4º O médico registrará, no prontuário, as diretivas antecipadas de vontade que lhes foram diretamente comunicadas pelo paciente.

§ 5º Não sendo conhecidas as diretivas antecipadas de vontade do paciente, nem havendo representante designado, familiares disponíveis ou falta de consenso entre estes, o médico recorrerá ao Comitê de Bioética da instituição, caso exista, ou, na falta deste, à Comissão de Ética Médica do hospital ou ao Conselho Regional e Federal de Medicina para fundamentar sua decisão sobre conflitos éticos, quando entender esta medida necessária e conveniente.

Art. 3º Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação.

 

Brasília-DF, 9 de agosto de 2012

 

Assim, do ponto de vista jurídico, o testamento vital tem validade, uma vez que seu conteúdo é de disposições extrapatrimonial, portanto atende aos requisitos legais, além de contemplar importantes princípios constitucionais da pessoa humana, em especial o da dignidade, que terá sua proteção inclusive no momento da morte.

 

 

  1. REQUISITOS LEGAIS

A legislação brasileira que trata dos testamentos em geral está contida no Código Civil, no Livro das Sucessões, pois esta é uma das formas de disposições patrimoniais, consignando a vontade do indivíduo, para depois da sua morte.

Atualmente é necessário que o testamento ordinário seja escrito, na forma pública, particular ou cerrado, com uma série de solenidades previstas na legislação para cada uma destas formas.

Para o chamado testamento vital, a Resolução do CFM não apresentou maiores formalidades, muito menos a idade mínima ou outros requisitos, deixando esta lacuna para o direito, que, por analogia, poderia prever a idade mínima de 16 anos e, também, na presença de testemunhas para confirmar a capacidade de discernimento do testador.

Outro requisito e possibilidade importante é a sua revogabilidade, ou seja, poderá ser alterado ou rescindido a qualquer momento, além dele valer somente nos casos em que o paciente estiver efetivamente em fase terminal da sua vida.

 

 

 

CONCLUSÃO

 

Vários são os aspectos ainda a serem definidos em relação ao testamento vital, cabendo provavelmente ao legislador ou aos Julgadores dos diversos Tribunais a complementação das informações, requisitos e efeitos necessários para que o testamento vital seja recebido e utilizado como um importante instrumento de definição do tratamento a que a pessoa queira (ou não) ser submetido em uma fase da sua vida que a razão deve estar acima da emoção e do afeto, base do relacionamento familiar, sempre presente na fase final da vida.


[1] Advogada inscrita na OAB/SC sob nº 14.149. Sócia Fundadora do Escritório de Advocacia Piazera, Hertel, Manske & Pacher Advogados Associados, inscrito na OAB/SC sob nº 1.029. Mestre em Ciências Jurídicas pela UNIVALLI. Professora do Centro Universitário Católica de Santa Catarina ? Unidade Jaraguá do Sul.

 

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