Daniele Janssen

 

RESUMO

A ação de inventário tem como seu principal objeto a partilha de bens deixados pelo falecido. Assim, em tese, para abertura de inventário é necessário a existência de bens.

Porém, mesmo não estando presente na legislação brasileira, a doutrina e a jurisprudência expressam a possibilidade de existir inventário negativo, que diz respeito à comprovação de inexistência de bens do de cujus. 

Palavras-chave: inexistência de bens, partilha, comprovação, inventário.

 

1. INTRODUÇÃO

Presente no Direito das Sucessões, o inventário é o procedimento utilizado para apuração dos bens deixados pelo de cujus, e sua consequente partilha e transferência aos herdeiros.

Tanto o Direito Civil quanto o Direito Processual Civil fazem menção quanto à importância da abertura de inventario, que pode ser ingressado tanto na esfera judicial quanto extrajudicial.

Porém, mesmo não estando expressa na legislação, a família daquele que falece sem deixar nenhum bem, com força na doutrina e jurisprudência, vem tendo a oportunidade de ingressar com inventário, mais conhecido como inventário negativo.

Essa comprovação de ausência de bens do falecido é importante para determinadas situações, como veremos a seguir.

2. DESENVOLVIMENTO

2.1. Conceito

O inventário negativo vem sendo como utilizado como providência facultativa, tendo o objetivo de afastar de plano a controvérsia, não podendo o juiz ou o cartório competente negar seu prosseguimento, desde que comprovada a inexistência de quaisquer bens em nome do falecido.

Neste âmbito, Hamilton de Moraes BARROS (1993) entende que:

?Pode acontecer que um morto não deixe bens e que seu cônjuge ou os seus herdeiros tenham necessidade da certeza jurídica desse fato. O meio jurídico de positivar isso é recorrer o interessado ao inventário negativo. Muito embora o Código não o discipline, o inventário negativo é, às vezes, uma necessidade do cônjuge sobrevivo ou dos herdeiros. Por isso, os juízes e a praxe o admitem como o modo judicial de provar-se, para determinado fim, a inexistência de bens.?

?Com ele, não se pretende inventariar o nada. Cuida-se, exatamente, de utilizá-lo para fazer certo que nada existe a inventariar. Concebido para inventariar o nada seria, sem dúvida, uma onerosa inutilidade. Usado, entretanto, para firmar que nada existiu que devesse ser inventariado, para fazer certo que inexiste herança, é uma necessidade do Direito, pois que produzirá efeitos jurídicos.?

Ainda, é possível observar entendimentos sólidos sobre o tema, conforme Jurisprudências dos Tribunais de Justiça, como estes que seguem transcritos:

?INVENTÁRIO NEGATIVO. INEXISTÊNCIA DE BENS. EXTINÇÃO DO PROCESSO. APELAÇÃO CÍVEL. CERTEZA JURÍDICA DE QUE “A DE CUJUS” NÃO DEIXOU BENS. CÓDIGO CIVIL, INC. XIII DO ART. 183 E § ÚNICO DO ART. 228. NECESSIDADE, LEGITIMIDADE E INTERESSE DO CÔNJUGE SOBREVIVENTE. SENTENÇA ANULADA. RECURSO PROVIDO.CÓDIGO CIVILXIII183§ ÚNICO228O chamado “inventário negativo” não existe em lei, é uma criação da praxe forense, e tem lugar nos casos em que o “de cujus” não deixa bens, e quando a lei exige que o cônjuge supérstite, para casar-se no regime da comunhão, dê a inventário os bens do primeiro matrimônio, à vista do disposto no inciso XIII do artigo 183, e inciso I, do § único do artigo 228, do Código Civil. (1050615 PR 0105061-5, Relator: Ivan Bortoleto, Data de Julgamento: 14/08/2001, 5ª Câmara Cível, Data de Publicação: 5955)?.

?CIVIL. AÇÃO DE INVENTÁRIO NEGATIVO. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. IRRELEVÂNCIA. PROCEDIMENTO DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA ADMITIDO PELA DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA. PEDIDO JURIDICAMENTE POSSÍVEL. CASSAÇÃO DA SENTENÇA E RETORNO DO PROCESSO À ORIGEM PARA REGULAR TRAMITAÇÃO.

A teor de consolidado entendimento doutrinário-jurisprudencial, admite-se o procedimento de inventário negativo quando o interessado pretender declaração judicial de inexistência de bens do falecido, de modo a salvaguardar seu patrimônio pessoal de dívidas eventualmente deixadas pelo de cujus. (Acórdão: Apelação Cível n. 2006.017664-4, da Capital/Distrital do Norte da Ilha. Relator: Des. Luiz Carlos Freyesleben. Data da decisão: 20.07.2006).?

 

2.2. Situações de aplicação

Existem algumas situações específicas em que o procedimento de Inventário Negativo vem sendo admitido, como por exemplo:

2.2.1. Viúvo ou a viúva deseje contrair novas núpcias:

Faculta ao viúvo(a) que deseja casar-se novamente, porem ainda não efetuou inventario para partilhar os bens do casal, impedindo-o(a) de sofrer sanção.

?Art. 1.523, I – o viúvo ou a viúva que tiver filho do cônjuge falecido, enquanto não fizer inventário dos bens do casal e der partilha aos herdeiros;?

Porém, é necessário destacar, que para a efetivação do artigo anteriormente mencionado, não se faz necessário o inventário negativo, sendo apenas uma maneira facultativa, podendo ser comprovado notoriamente a inexistência de bens, como a Súmula que segue:

?Civil. Regime de bens. Segundo casamento, tendo filhos do anterior um dos cônjuges. A falta do chamado inventário negativo não acarreta por si mesma, o regime da separação de bens no segundo casamento, uma vez provado que notoriamente não havia bens a inventariar. Interpretação razoável da Lei (Súmula 400). (RE 90650, Relator(a): Min. Décio Miranda, Segunda Turma, julgado em 13/05/1980, DJ 01-07-1980 PP-04947 EMENT VOL-01177-02 PP-00727 RTJ VOL-00094-03 PP-01262).?

2.2.2. Responsabilidade além das forças da herança (CC/02, art. 1.792)

No caso do falecido ter deixado credores, certamente estes irão cobrar estas dívidas dos sucessores.

Maria Helena Diniz discorre sobre esta hipótese:

?O inventário negativo tem por escopo demonstrar que os interessados não receberam nenhum bem do espólio, principalmente se o de cujus deixou credores, para que aqueles não respondam por tais débitos (CC, art. 1.792)?.

Assim, o inventário negativo pode ser utilizado pelos herdeiros como forma de comprovar a inexistência de bens, ou até mesmo a insuficiência para efetuar o pagamento das dívidas que o espólio deixou, pois devem os herdeiros apenas se responsabilizar pelas obrigações até o limite da herança recebida.

2.2.3. Substituição Processual

A regularização do pólo ativo/passivo em ação judicial, após a morte da parte, gera outra possibilidade do ingresso de inventário negativo.

?Art. 43. Ocorrendo a morte de qualquer das partes, dar-se-á a substituição pelo seu espólio ou pelos seus sucessores, observado o disposto no art. 265.?

Com o termo de inventariante efetuado, terá o inventariante capacidade de representar o falecido, ocorrendo a substituição processual pelo espólio ou sucessores do falecido.

Vale constar, porém, que no art. 1.060, CPC, é possível ocorrer a habilitação dos herdeiros nos autos, independentemente de sentença, bem como, sem a necessidade de abertura de inventário.

2.2.4. Valores não recebidos em vida

Nas hipóteses em que o falecido não recebeu determinados valores enquanto estava vivo, discorre a Lei 6.858/80, a respeito do pagamento aos dependentes ou sucessores do titular.

Destaca-se, portanto, que a própria legislação dispensa ação de inventário ou arrolamento de bens, facultando assim o ingresso de inventário negativo.

2.2.5. Outras hipóteses

Ainda que, para alguma outra razão, alguém necessite provar que o falecido não deixou bens patrimoniais a inventariar, o inventário negativo pode ser utilizado para outros fins, que não os já mencionados acima.

A outorga de escritura a compromissários compradores de imóveis vendidos pelo autor da herança, enquanto vivo, é uma destas outras possibilidades, bem como, o ingresso de inventário negativo para efetuar a baixa fiscal ou encerramento legal de pessoa jurídica de que o falecido era sócio.

2.3. Inventário x Inventário negativo

Muitas semelhanças existem entre as duas espécies de inventário. Porém, por não ter a existência de bens, o inventário negativo tem um procedimento mais simples e ágil.

Após fazer o pedido de inventário negativo e nomeado inventariante, o mesmo deverá indicar a pessoa que ficará responsável pelo patrimônio do falecido, quais sejam: dívidas, créditos, etc. O termo de inventariante será utilizado em todas as ocasiões em que o falecido será representado.

Ao ser comprovada a inexistência de dívidas do falecido junto aos órgãos públicos, bem como a inexistência de bens tanto móveis quando imóveis, a sentença homologatória será de natureza declaratória.

2.4. Extrajudicial

            Mesmo não estando presente na legislação brasileira, a Resolução nº 35, do Conselho Nacional de Justiça, que visa regulamentar a Lei nº 11.441/07, fez menção ao inventário negativo, em seu art. 28, dando a oportunidade de ser efetuado através de escritura pública.

Assim, é admissível a realização de inventário negativo não só judicial, como também, extrajudicial, devendo todas as partes serem capazes e concordes e estejam assistidas por advogado comum ou advogados de cada uma delas ou por defensor público (CPC, art. 982).

 

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante de todo o exposto, por se tratar de um assunto em que o ordenamento jurídico brasileiro é omisso, é possível obter entendimentos através da doutrina e da jurisprudência, que vem sendo favoráveis a este procedimento.

Assim, na ocorrência do falecido não deixar bens a inventariar, o objetivo do ingresso de inventário negativo é provar esta inexistência de bens. Por se tratar de uma medida facultativa, não tem nenhuma obrigatoriedade, nem mesmo intenção de transmitir bens nem direitos.

Não tendo sua aplicação impedida, afasta dúvidas quanto à existência de bens para possível partilha entre herdeiros, e principalmente para determinadas situações, que podem servir de comprovante aos credores do de cujus, bem como para impedir a presença de impedimento materiais aos viúvos que queiram ter novos casamentos.

Sendo assim, utilizada para alguns fins legais, esta criação da praxe forense, mesmo sem previsão legal, vem sendo admitida favoravelmente, podendo evitar futuros embaraços.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

BARROS, Hamilton de Moraes e. Comentários ao Código de Processo Civil: lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993, v. 9.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. V6: Direito das Sucessões. 16 ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões. 9, Ed. São Paulo: Atlas, 2009.

BRASIL. Lei n° 5.869, de 11 de Janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 30/04/2013.

BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em 30/04/2013.

 

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