Em janeiro de 2015, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina reformou decisão de 1º grau, admitindo a possibilidade jurídica de se discutir pedido de indenização por danos morais coletivos – oriundo de maus tratos a animais, no caso, a um cão, por seu próprio dono, que o deixava acorrentado no quintal de casa sem água e sem comida, além de negligenciar doença que levou à amputação da pata traseira.

 

Entendeu o Desembargador relator do processo que o dano que causamos ao tirar a vida ou comprometer a integridade de outro ser não é consequência da sua capacidade intelectual. Devemos proteger aqueles seres que, por sua vulnerabilidade, são dotados de capacidade de sofrer – um sofrimento que é físico e psíquico.

Em outras palavras, têm direitos fundamentais aqueles indivíduos que são seres sencientes – seres capazes de sentir dor e prazer.

Tendo em vista tal fundamentação, penso que a pretensão tenha por base a ocorrência de danos morais diretamente causados ao canino. Ora, em nossa legislação, é tal categoria de danos que abarca as sensações de dor e desprazer, atingindo a incolumidade física e psíquica do sujeito passivo da lesão, bens de caráter extrapatrimonial.

Logo, concluo que a condenação almejada diz com a ocorrência de prejuízos de tal ordem, devendo ser apreciada sob tal ótica.

No ponto, penso ser necessário relembrar que, segundo nosso ordenamento jurídico, apenas pessoas físicas ou jurídicas – estas, por autorização legal, mediante ficção jurídica – são consideradas sujeitos de direito. Daí porque o Código Civil, logo em seu artigo 1º, estabelece que “toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil”. Logo na sequência, diz o artigo 2º que “a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida”.

Segundo penso, a ordem jurídica brasileira ainda não alcançou o patamar de reconhecer os animais como sujeitos de direito em condições de igualdade com os seres humanos. Ainda reconhecemos a nós mesmos direitos que não conferimos aos integrantes da fauna, como, por exemplo, a reparação do dano moral, aqui pretendida.

É certo que há muito tutelamos os animais, consoante explicitou a própria recorrente em sua inicial, quando faz menção ao Decreto n. 24.645, editado em 1934, no primeiro governo de Getúlio Vargas. Lá, porém, a tutela não era conferida no âmbito civil; antes, tinha caráter penal e administrativo, consoante se pode depreender do artigo 12 do mencionado diploma:As penas pecuniárias serão aplicadas pela polícia ou autoridade municipal e as penas de prisão serão da alçada das autoridades judiciárias“. (…)

Quanto ao pedido de condenação do autor dos fatos ao pagamento de uma quantia, a título de danos morais coletivos, em favor de uma entidade de cuidados à animas, representando a própria sociedade, entendeu que é necessária a comprovação da existência de lesão à incolumidade psíquica de uma coletividade de pessoas, causando uma certa comoção social:

Assim, não obstante tenha o juízo de origem assinalado a impossibilidade jurídica do pedido, tenho que o arcabouço legislativo pátrio está, sim, a admitir a possibilidade da pretensão, porquanto prevista em abstrato no ordenamento brasileiro. Com isso, levando em conta que é juridicamente admissível tudo aquilo que não seja expressamente proibido pela legislação, não vejo como deixar de dar seguimento à ação neste tocante.

É certo que incumbirá ao órgão do parquet demonstrar a existência dos danos morais coletivos, pois que estes somente se configuram quando graves “o suficiente para produzir verdadeiros sofrimentos, intranquilidade social e alterações relevantes na ordem extrapatrimonial coletiva” (REsp 1291213/SC, rel. Min. Sidnei Beneti, j. 30.8.2012). Todavia, a demonstração de tal ocorrência é questão relacionada com o mérito, não sendo possível interromper precocemente o feito sem possibilitar à parte autora a comprovação do alegado.

Assim, o importante marco desta decisão reside justamente na admissão de processo para discutir dano moral social oriundo de maus tratos causados a um animal, que, apesar de não possuir personalidade jurídica própria e, portanto, poder receber alguma quantia, é um bem jurídico que a sociedade pretende proteger daqueles que, insanamente, corrompem os valores morais e éticos atuais.

Dados do processo: TJSC. Processo: 2011.051779-8 (Acórdão) Relator: Sérgio Izidoro Heil. Origem: São Francisco do Sul. Orgão Julgador: Quinta Câmara de Direito Civil. Julgado em: 22/01/2015.

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