RESUMO

O presente artigo se destina a investigação dos aspectos fáticos e jurídicos que envolvem a inadimplência do ICMS catarinense, assim caracterizada nos casos em que o contribuinte apura e declara o montante do tributo devido, da forma estabelecida pela regulamentação da autoridade fazendária, e deixa de recolhê-lo no prazo oportuno devido à impossibilidade de caixa (dificuldades financeiras), comprovada pela contabilidade do contribuinte.

A abordagem passa, centra-se na análise da majoração do percentual da multa moratória de 25%, prevista no art. 53 da Lei nº 10.297/96, para 50%, prevista no art. 51, inc. III, do mesmo diploma legal.

Ressalte-se, portanto, que a investigação em questão se limita aos casos em que não há caracterização de fraude, nem de nenhuma manobra por parte do contribuinte com o intuído de furtar-se do pagamento da exação. Trata-se, em verdade, de tributo declarado e não recolhido, motivado por impossibilidade de caixa.

GUSTAVO PACHER

PALAVRAS CHAVE

TRIBUTÁRIO. ICMS. SANTA CATARINA. TRIBUTO DECLARADO E NÃO RECOLHIDO. MAJORAÇÃO MULTA. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO FISCAL.

DA CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO

Conforme anunciado no preâmbulo, o presente artigo se limitará aos casos em que há estrita observância do contribuinte catarinense à legislação de regência para a constituição do crédito tributário devido.

Para tanto, o tributo deverá ser previamente apurado e declarado através da Declaração do ICMS e do Movimento Econômico (DIME), em cada uma das competências, de modo a possibilitar que a fazenda estadual conheça dos fatos geradores e, consequentemente, valores do tributo devido.

Com efeito, mais informações acerca da DIME podem ser obtidas no sítio da Secretaria de Estado da Fazenda (www.sef.sc.gov.br), onde se encontra a sua apresentação nos seguintes termos.

?A Declaração do ICMS e do Movimento Econômico ? DIME será apresentada, em arquivo eletrônico, pelas empresas para informar à Secretaria da Fazenda o resumo mensal das suas operações e prestações registradas no livro Registro de Apuração do ICMS. O arquivo eletrônico terá especificações técnicas conforme manual de orientações publicado em Portaria do Secretário de Estado da Fazenda.?[1]

Assim, após a entrega/encaminhamento da DIME, a fazenda estadual disporá das informações que entende necessárias (nos termos da regulamentação que estabeleceu para a mencionada declaração), especialmente os valores devidos pelo contribuinte, sem que para tanto seja necessário qualquer esforço/diligência no sentido de constituir o crédito tributário.

Nesse sentido, por se tratar de tributo sujeito à lançamento por homologação, conforme reiterada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), os montantes estão aptos a inscrição em dívida ativa e deflagração do procedimento contencioso de cobrança ? ajuizamento da Execução Fiscal.

Entretanto, não obstante essa situação, sem que haja qualquer outra finalidade lógica senão a majoração da multa, de 25% para 50%, existe previsão na legislação estadual para a expedição do famigerado termo de CONTITUIÇÃO DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO, que habitualmente possui as seguintes características:

DESCRIÇÃO DA INFRAÇÃO:

?Deixar de efetuar, total ou parcialmente, o recolhimento do ICMS relativo às operações/prestações tributáveis, escrituradas pelo próprio contribuinte no Livro de Registro de Apuração do ICMS e declarado na DIME ? Declaração do ICMS e do Movimento Econômico.?

FUNDAMENTAÇÃO LEGAL

?DA INFRAÇÃO: RICMS-SC, aprovado pelo Decreto nº 2.870, de 27/08/01, art. 60, ´caput´.

DA MULTA: Lei 10.297, de 26/12/96, artigo 51, inciso I (50% do valor do imposto).

DA ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA:

DOS JUROS: Lei nº 5.983, de 27/11/81, artigo 69, observado as Leis nº 10.297, de 26/12/96, de 10.369, de 24/01/97.?

Após o recebimento do mencionado termo/notificação, é facultado ao contribuinte catarinense a apresentação de reclamação, no prazo de 30 (trinta) dias, dando início à fase contenciosa do processo administrativo tributário catarinense, facultando-se, inclusive, a interposição de recurso para o Tribunal Administrativo Tributário? algo completamente desproporcional e irrazoável nos casos de tributo declarado e não recolhido.

DO PROCEDIMENTO IMPLEMENTADO PELA SECRETARIA DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DO  ESTADO DE SANTA CATARINA ? TERMO DE ?CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO?

Conforme destacado, os contribuintes catarinenses vem sendo ?notificados? por haverem declarado valores em DIME, e não pago o respectivo ICMS, nas respectivas competências, acrescidos de juros de mora, e multa.

Contudo, independente da origem do débito tributário nos casos em questão, quando o tributo foi integralmente declarado pelo contribuinte em DIME, a aludida multa acaba majorada para 50% do montante do imposto devido, com base no art. 51, inc. I da Lei nº 10.297/96, in verbis:

Art. 51. Deixar de recolher, total ou parcialmente, o imposto:

I – apurado pelo próprio sujeito passivo;

II – devido por responsabilidade ou por substituição tributária;

III – devido por estimativa fiscal:

MULTA de 50% (cinqüenta por cento) do valor do imposto.

Evidente o abuso perpetrado pela autoridade fiscal, quando dobra o valor exigido a título de multa, com base em mera ´reclassificação´ legal, fundada exclusivamente na expedição do mencionado termo de CONSTITUIÇÃO DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO.

Data vênia, vale o registro de que não se pode concordar com tal procedimento, vez que, conforme destacado, os débitos se tratam de tributo sujeito a lançamento por homologação, cujos valores restaram integralmente constituídos / declarados pelo contribuinte, prescindindo, portanto, de qualquer outro procedimento fiscal para a sua constituição.

Estando o débito integralmente declarado pelo contribuinte (lançamento por homologação, repita-se), não há necessidade de qualquer outro procedimento administrativo tendente à sua constituição, a teor do que estabelece o Código Tributário Nacional, bem como a jurisprudência dominante no Superior Tribunal de Justiça, observe-se:

RECURSO REPETITIVO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. SÓCIO. DCTF. GIA. CRÉDITO TRIBUTÁRIO.

No recurso submetido ao regime do art. 543-C do CPC e art. 6º da Res. n. 8/2008-STJ, a Seção assentou que a simples falta de pagamento de tributo não acarreta, por si só, a responsabilidade subsidiária do sócio (art. 135 do CTN), se inexistir prova de ele ter agido com excesso de poderes em infração à lei, ao contrato social ou ao estatuto da sociedade empresarial. Outrossim, a apresentação da declaração de débitos e créditos tributários fiscais (DCTF), de guia de informação e apuração de ICMS (GIA), ou de outra declaração dessa natureza com previsão legal constitui o crédito tributário, não havendo necessidade de outra providência por parte do Fisco. Precedentes citados: EREsp 374.139-RS, DJ 28/2/2005; REsp 1.030.176-SP, DJe 17/11/2008; REsp 801.659-MG, DJ 20/4/2007; REsp 962.379-RS, DJe 28/10/2008; AgRg nos EREsp 332.322-SC, DJ 21/11/2005; AgRg nos EREsp 638.069-SC, DJ 13/6/2005;  REsp 510.802-SP, DJ 14/6/2004, e REsp 437.363-SP, DJ 19/4/2004. REsp 1.101.728-SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, julgado em 11/3/2009 (veiculado no Informativo do STJ nº 0386, de 09-13/03/2009). (destacamos)

Nesse sentido, inclusive, pelo inteiro teor do aresto acima destacado, que foi julgado pelo egrégio STJ como precedente de ?recurso repetitivo?, importante destacar que nenhum Recurso Especial será admitido por aquele tribunal, contra decisões que observarem a orientação em questão, que, portanto, passará a nortear a atuação dos Tribunais de Justiça dos demais estados da Federação, especialmente o de Santa Catarina.

Sendo assim, com a declaração do contribuinte em DIME (que substituiu a GIA), o crédito tributário está apto à imediata inscrição em dívida ativa do Estado e, consequentemente, ao ajuizamento da Execução Fiscal.

Portanto, completamente desnecessário qualquer outro procedimento administrativo com vistas à constituição do crédito tributário, como, por exemplo, o ora combatido.

No entanto, mesmo ciente das reiteradas decisões proferidas pelo STJ, a Secretaria de Administração Tributária do Estado de Santa Catarina (SAT/SC) insiste no procedimento adotado há anos, tornando a ?re-constituir? o crédito tributário já declarado em DIME pelo contribuinte por meio da famigerada notificação de ?CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO?.

Registre-se também, por oportuno, que nenhuma crítica existe ao procedimento e, questão para os casos de lançamento de ofício, que devem observar a regulamentação vigente para o acertamento do crédito tributário ? situação completamente diversa daquela enfrentada nos casos de tributo declarado e não recolhido.

Aparentemente, tal prática é perpetrada pela SAT/SC, exclusivamente, com o intuito de coagir o contribuinte ao recolhimento do crédito tributário em questão, sob a ameaça de majoração da multa (ao dobro ? de 25% para 50%), no prazo de 30 dias, caso o contribuinte realize o pagamento nesse período (antes da expedição do termo de CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO, a multa se mantém em 25%, repita-se.

observe-se a previsão legal veiculada pelos artigos 51 e 53 da Lei nº 10.297/96, quando estabelece a multa para casos como o presente (débito declarado e não pago pelo contribuinte até o vencimento):

Art. 51 (Lei nº 10.297/96)

Art. 53 (Lei nº 10.297/96)

Art. 51. Deixar de recolher, total ou parcialmente, o imposto:

I – apurado pelo próprio sujeito passivo;

II – devido por responsabilidade ou por substituição tributária;

III – devido por estimativa fiscal:

MULTA de 50% (cinqüenta por cento) do valor do imposto.

 

Art. 53. Submeter tardiamente operação ou prestação tributável à incidência do imposto ou recolher o imposto apurado, pelo próprio contribuinte, ou o devido por estimativa fiscal, após o prazo previsto na legislação, antes de qualquer procedimento administrativo ou medida de fiscalização:

MULTA de 0,3% (três décimos por cento) ao dia, até o limite de 25% (vinte e cinco por cento).

Não bastasse a previsão normativa em questão, reiterando o seu intuito de coagir o contribuinte ao recolhimento do crédito tributário, a SAT/SC jocosamente lança no corpo da notificação de ?CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO? a seguinte expressão:

?[…]Prazo de 30 dias, a contar da data de ciência, para pagamento integral, pedido de parcelamento ou apresentação de reclamação ao Conselho Estadual de Contribuintes, a ser protocolada em quaisquer das unidades da Secretaria da Fazenda. O pagamento, exceto IPVA, efetuado no prazo citado, dará direito à redução de 50% da multa. […]? (destaque nosso)

Desta forma, pelo que se demonstrou, a SAT/SC adota o procedimento em tela, ferindo a estrita legalidade, especialmente quando deixa de observar os mandamentos do Código de Direitos e Deveres do Contribuinte de Santa Catarina – Lei Complementar nº 313/05 (CDDC-SC), a saber:

[LC Nº 313/05] Art. 11. É vedada, para fins de cobrança extrajudicial de tributos, a adoção de meios coercitivos contra o contribuinte, tais como a interdição de estabelecimento, a proibição de transacionar com órgãos e entidades públicas e instituições oficiais de crédito, a imposição de sanções administrativas ou a instituição de barreiras fiscais.

Pela simples leitura do comando em questão, veiculado por lei complementar estadual, de hierarquia superior à lei nº 10.297/96 (ordinária), bem como posteriormente editada, há que se concluir pela ilegalidade do procedimento adotado pela SAT/SC, que majorou a multa de 25% para 50%, sem que a situação fática/fiscal da contribuinte houvesse sofrido qualquer modificação.

Ainda, impõe-se destacar que, caso a SAT/SC houvesse praticado o procedimento adequado, submetendo o crédito tributário em questão diretamente à inscrição em dívida ativa, com multa de 25%, inclusive, estaria observando outra prerrogativa assegurada pelo CDDC-SC, pois, com  a declaração do crédito tributário em DIME ocorre a sua constituição definitiva, apta a ensejar a inscrição em dívida ativa no prazo de até 30 dias.

[LC Nº 313/05] Art. 45. É obrigatória a inscrição do crédito tributário na dívida ativa no prazo de até 30 (trinta) dias, contados de sua constituição definitiva, sob pena de responsabilidade funcional pela omissão.

Ainda, além dos comandos específicos, destacados anteriormente, o CDDC-SC ratifica os princípios consagrados pela Constituição Federal, que devem ser observados/respeitados pela Administração Tributária, no desempenho de suas atribuições, com vistas à pautar a sua atuação objetivando minimizar o ônus imposto aos contribuintes, in verbis:

[LC Nº 313/05] Art. 34. A Administração Tributária, no desempenho de suas atribuições, pautará sua atuação de forma a gerar o menor ônus possível aos contribuintes, tanto no procedimento e no processo administrativo, como no processo judicial.

[…]

[LC Nº 313/05] Art. 39. A Administração Tributária obedecerá, dentre outros, aos princípios da justiça, legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

Com efeito, data vênia, não há como compatibilizar o procedimento fiscal combatido (que majorou a multa de 25% para 50%), com os princípios e comandos consagrados pelo Código de Direitos e Deveres do Contribuinte de Santa Catarina, merecendo, portanto, ser afastada a majoração da multa ? mantendo-se a sua fixação em 25% do valor do tributo devido.

No mesmo sentido é a garantia veiculada pelo art. 150, inc. IV da Constituição Federal, que consagra os princípios constitucionais implícitos da razoabilidade e proibição de excesso:

Art. 150 – Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

[…]

IV – utilizar tributo com efeito de confisco;

Desta forma, por qualquer análise/ótica, há que se concluir pela insubsistência da majoração da multa, seja pela afronta à legislação estadual (lei local), ou, principalmente, pela sua incompatibilidade com a Constituição Federal.

Sobre a impossibilidade de utilização da multa como meio coercitivo de cobrança, graduada conforme a atuação do contribuinte, há que se destacar o procedente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, quando ao cuidar da contribuição previdenciária (AP nº 2006.71.99.002290-6/RS, DJU 08/11/2006), assim decidiu:

TRIBUTÁRIO. MULTA MORATÓRIA X MULTA DE OFÍCIO. . ART. 35 DA LEI 8.212/91. GRADUAÇÃO DA MULTA DE OFÍCIO CONFORME O TEMPO E A PRÁTICA DE ATOS ADMINISTRATIVOS. SOBREPOSIÇÃO AOS JUROS. RAZOABILIDADE. VEDAÇÃO DO CONFISCO. INCONSTITUCIONALIDADE SUSCITADA.

Pode haver distinção entre o percentual de multa simplesmente moratória, quando o contribuinte não paga tempestivamente por falta de recursos mas o faz antes de qualquer atividade do Fisco contra ele, e de multa de ofício, quando o contribuinte oculta ou simplesmente não leva ao conhecimento do Fisco a ocorrência de fatos geradores ou o montante total das suas bases de cálculo, hipótese em que apenas a ação fiscal desenvolvida pela Fiscalização é que acaba por identificar a existência do débito e constitui o respectivo crédito por lançamento.

A multa prevista no art. 35 para o caso de NFLD é de 24%. Daí para mais, há variações conforme a postura do contribuinte ou a prática de atos administrativos ao longo do tempo (tamanho da mora, pagamento integral ou parcelado, inscrição em dívida, ajuizamento da execução).

Ocorre que, havendo débito, são os juros moratórios que restam previstos no art. 161 do CTN como compensação pela mora do contribuinte. Não se pode admitir que a multa acabe por assumir, também ela, uma função de compensação progressiva pela mora, em sobreposição aos juros que não se justifica. A variação da multa em função da mora ofende a razoabilidade no que diz com os critérios da adequação e da congruência.

A multa deve ter relação com o ilícito cometido, qual seja, no caso, a falta de apuração e declaração, pelo próprio contribuinte, dos tributos devidos.

Também o princípio da proibição do excesso, decorrente do próprio princípio do Estado de Direito, impede que se tenha multas demasiadamente altas, cumprindo, para as multas, o papel da vedação do confisco direcionada aos tributos. O STF tem admitido a censura constitucional de multas excessivas/confiscatórias, inclusive mediante invocação do art. 150, inciso IV, da CF.

A multa do lançamento de ofício, no art. 35 da Lei 8.212/91, varia de 24% a 100% sem que nenhum novo ilícito tenha sido praticado, apenas pelo decurso de tempo em que o credor realiza atos tendentes à satisfação do seu crédito.

Suscitado Incidente de Argüição de Inconstitucionalidade do art. 35, inciso II, alíneas “b” a “d”, e III, alíneas “a” a “d”, com a redação das Leis 90.528/97 e 9.876/99, por violação ao art. 150, IV, da CF e aos princípios constitucionais implícitos da razoabilidade e da proibição do excesso.

Por pertinência, do corpo do voto colhe-se a seguinte contribuição:

?[…]

Não há dúvida de que pode haver distinção nos percentuais de multa simplesmente moratória, quando o contribuinte não paga tempestivamente por falta de recursos mas o faz antes de qualquer atividade do Fisco contra ele, e de multa de ofício, quando o contribuinte deixa de apurar a totalidade do montante devido, ocultando ou simplesmente não levando ao conhecimento do Fisco a ocorrência de fatos geradores ou o montante total das suas bases de cálculo, hipótese em que apenas a ação fiscal desenvolvida pela Fiscalização é que acaba por identificar a existência do débito e por constituir o respectivo crédito por lançamento.

A multa prevista no art. 35 para o caso de NFLD é de 24%. Daí para mais, há variações conforme a postura do contribuinte ou a prática de atos administrativos ao longo do tempo (tamanho da mora, pagamento integral ou parcelado, inscrição em dívida, ajuizamento da execução).

Ocorre que, havendo débito, são os juros moratórios que restam previstos no art. 161 do CTN como compensação pela mora do contribuinte.

A multa deve ter relação com o ilícito cometido, qual seja, a não apuração adequada dos tributos devidos e seu pagamento no prazo.

Não se pode admitir que a multa acabe por assumir, também ela, uma função de compensação pela mora, pois acaba por assumir o papel dos juros, em sobreposição que não se justifica. A variação da multa em função da mora ofende a razoabilidade no que diz com os critérios da adequação e da congruência.

À infração cometida, deve corresponder a multa, mas não variável com o passar do tempo, pois inexiste nova infração. O acréscimo não aguarda adequação e congruência com a conduta objeto de punição, de modo que ofende o princípio da razoabilidade.

Também o princípio da proibição do excesso, decorrente também do próprio princípio do Estado de Direito, impede que se tenha multas demasiadamente altas, cumprindo, para as multas, o papel da vedação do confisco direcionada aos tributos. O STF tem admitido a censura constitucional de multas excessivas/confiscatórias, inclusive mediante invocação do art. 150, inciso IV, da CF.

Note-se, inclusive, que a multa do lançamento de ofício, no art. 35 da Lei 8.212/91, pode variar de 24% a 100% sem que nenhum novo ilícito tenha sido praticado, apenas pelo decurso de tempo em que o credor realiza atos tendentes à satisfação do seu crédito. Tal variação acaba por se tornar muito mais onerosa que o próprio encargo legal de 20% previsto, para as execuções da União, no DL 1065/69, em que faz as vezes dos honorários. Nas execuções do INSS, podemos acabar tendo um acréscimo de multa de quase 80% apenas em razão do maior decurso do prazo, com a inscrição e ajuizamento da execução, e ainda são fixados honorários nos eventuais embargos que o contribuinte oponha.

A situação, como se vê, é de extremado excesso, falta de razoabilidade e, assim, violação à esfera jurídica do contribuinte inadimplente que deve, sim, pagar a multa de ofício de 24% e os juros moratórios por todo o período da mora, mas que não pode ser submetido à referida variação da multa, por inconstitucional. […]? (destaque da reclamante)

Assim, sem mais delongas, impõe-se a conclusão de que é inconstitucional a majoração da multa nos casos de tributo declarado e não recolhido (que chega a dobrar ? variando de 25% para 50%), sem que nenhum ato/?novo ilícito? seja praticado pelo contribuinte.

Data maxima venia, não há razoabilidade capaz de justificar a majoração da multa, levada à efeito pela autoridade fiscal, pois, o ato praticado (notificação de ?CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO?) não possui qualquer outra finalidade que não seja a majoração da multa

A situação na qual se encontram os contribuintes não pode subsistir, necessitando de urgente revisão do procedimento administrativo adotado, para que seja conferido tratamento razoável ao caso presente, homenageando, além do princípio da razoabilidade, os princípios da livre iniciativa e da continuidade da atividade empresarial.

Humberto Ávila sustenta, com propriedade, que a razoabilidade se trata de uma observação concreto-individual dos bens jurídicos envolvidos, não de um exame abstrato de proporcionalidade[2]. A ênfase na apreciação de um caso, regida pela razoabilidade, se dirigirá à excepcionalidade do caso concreto.

A razoabilidade, em síntese, exige normas gerais arrimadas na realidade social cujos fins são satisfeitos por medidas em harmonia com as individualidades do caso concreto, como ocorre no presente caso.

Em outras palavras, necessário que esteja presente a congruência entre o ato praticado e o resultado alcançado de modo a legitimar a medida, nas palavras de Pedro Augusto Lopes Sabino:

?É imprescindível a existência de um suporte fático que sirva de alicerce para a adoção da medida. Esta deve se harmonizar com a natureza das coisas e com o critério adotado. Não será razoável uma medida sem correspondência com uma finalidade legítima?[3].

A observância do princípio da razoabilidade é crucial para o presente caso, porque resguarda os direitos dos contribuintes, dando mais azo à tutela da materialidade das normas constitucionais e legais, do que meros formalismos, perpetrados pela SAT/SC.

CONCLUSÃO

Pelo que se demonstrou, a legislação catarinense está legitimando uma distorção que não se harmoniza com os princípios norteadores da atuação da Administração Tributária Estadual, na medida em que determina a expedição de termo de CONSTITUIÇÃO DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO para os casos de tributo declarado e não recolhido, cujo efeito é unicamente majorar a multa cominada, de 25% para 50%.

Tal procedimento se mostra desproporcional, também, na medida em que equipara o tratamento dispensado ao contribuinte que declara integralmente seus débitos, prescindindo de qualquer atuação fiscal para a constituição, com o contribuinte que não os declara, ou o faz a menor, exigindo a atuação da autoridade fazendária para a constituição da diferença. Em ambos os casos a penalidade será de 50% (salvo os casos em que comprovadamente houver a caracterização da fraude).

Assim, para que se faça justiça fiscal, o tratamento jurídico dispensado aos casos de tributo declarado e não recolhido deve ser alterado, afastando a expedição do termo de CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO, e consequentemente a aplicação da multa de 50%.



[1] http://www3.sef.sc.gov.br/sat/dime/dime.htm;

[2] ÁVILA. “A distinção entre princípios e regras e a redefinição do dever de proporcionalidade”. Revista Diálogo Jurídico, Salvador, CAJ ? Centro de Atualização Jurídica, v. I, n.º 4, julho, 2001, pp. 29-30. Disponível em http://www.direitopublico.com.br. Acesso em: 25 de maio de 2003.

[3] SABINO, Pedro Augusto Lopes. Proporcionalidade, razoabilidade e Direito Penal . Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 340, 12 jun. 2004. Disponível em: . Acesso em: 17 out. 2006.

CategoryNotícias
Write a comment:

You must be logged in to post a comment.

        

© 2020 por Puxavante

PHMP Advogados OAB/SC 1.029

logo-footer

47 3084 4100

Rua Olívio Domingos Brugnago, 125

Vila Nova - CEP 89.259-260 - Jaraguá do Sul - SC

Termos de uso Politicas de Privacidade