Romeo Piazera Júnior[1]

1 INTRODUÇÃO

O presente artigo aborda a questão do avassalador e crescente número de pedidos de indenização por danos morais que abarrota as Varas do Trabalho em todo o país, bem como a maneira que o Judiciário Trabalhista vem enfrentando e julgando tais pedidos.

Se de um lado não se olvida da necessidade de que sejam coibidos os atos tidos como atentatórios à dignidade moral dos empregados, eventualmente praticados por empregadores, também se faz necessário dedicar especial atenção para que sejam exemplarmente punidos pela Justiça do Trabalho, os pedidos que, embora rotulados de `indenização por danos morais`, não passam de tentativa leviana de enriquecimento ilícito, pelos empregados, bem como caracterizam ato de má-fé processual, que deve merecer a reprimenda por parte dos magistrados.

O que se percebe, destarte, é que diante de pedidos absurdos de indenização por danos morais, os magistrados trabalhistas têm conseguido cada vez mais separar o `joio do trigo`, de modo que este relevante instituto do Direito ? o dano moral, não seja banalizado ou mesmo ridicularizado na forma como hodiernamente se vê.

2 O DANO MORAL NAS RELAÇÕES DE TRABALHO

É indiscutível que em razão do poder diretivo que o empregador exerce perante o empregado, este fica sujeito às determinações, controle, atuação disciplinadora e poder fiscalizador por parte daquele[2].

Sabe-se que nas relações existentes entre o capital e trabalho, protagonizadas pelos empregadores e empregados, respectivamente, é comum que ocorram excessos de ambos os lados, ora os empregadores pretendendo fazer valer sua força, representada pelo capital e poder de mando, ora pelos empregados, responsáveis pela força de trabalho indispensável à dinamização e desenvolvimento da máquina geradora de riquezas, seja na indústria, no comércio e na prestação de serviços.

E uma das formas de caracterização dos excessos cometidos pelos empregadores e empregados, refere-se ao dano moral sofrido, e que embora seja revestido de inegável subjetividade, mormente quando decorrentes de ações sorrateiras e silenciosas, muitas vezes configuram-se materialmente inclusive por meio de documentos, os quais possuem o condão inequívoco de registrar a potencialidade do dano causado.

É assente tanto na doutrina como na jurisprudência, que para que reste configurado o dano moral nas relações de trabalho, devem necessariamente encontrar-se presentes, de forma concomitante, seus elementos caracterizadores[3], a saber: [1] a certeza do dano; [2] atualidade; [3] pessoalidade; [4] nexo de causalidade; [5] legitimidade; e [6] ato ilícito.

Sem perder de vista os elementos caracterizadores do dano moral expostos no parágrafo anterior, também deve ser considerado um indissociável conjunto de razões que deve alicerçar a configuração deste dano e, neste sentido, oportuno e pertinente registrar o abalizado ensinamento da desembargadora Olga Aida Joaquim Gomieri[4], que sustentou que ?o pressuposto da reparação é a existência elementar de uma lesão ou dano?.

Ainda, no mesmo sentido asseverou a laboriosa desembargadora antes referida que ?o dano moral exsurge com a repercussão de uma conduta em dor, vexame, sofrimento, humilhação que (…) potencialize um abalo muito grande no comportamento psicológico do indivíduo?, distinguindo-se de ?mero dissabor, chateação, aborrecimento, irritação, amolação ou zanga…?. A desembargadora argumentou ainda que, ?se assim não entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações por meras insignificâncias?.

Escorado nos ensinamentos acima apresentados pela desembargadora referida, pertinente se faz destacar que justamente em razão da banalização do conceito de dano moral, o Judiciário Trabalhista se vê forçado a ter que decidir sobre pedidos que, embora com a ostentação de rótulo de ?dano moral?, na verdade, buscam leviano e absurdo enriquecimento ilícito, fazendo com que este importantíssimo instituto que serve de instrumento de justiça e paz social, fique relegado a um item que irresponsavelmente vem servindo de veículo para aventuras jurídicas, representadas pelos inúmeros e desfragmentados pedidos de danos morais decorrentes de relações de trabalho, sem real e verídica causa de pedir.

Referimo-nos, por exemplo, às alegações feitas reiteradamente pelos empregados de que, gerariam dano moral, [1] diferença de verbas rescisórias tidas como impagas; [2] não aceitação imediata, pelos empregadores que dispõem de serviço médico, de atestados de outros médicos; [3] sonorização de gênero de música tido como inadequado, em refeitório de empresa, dentre outros tantos exemplos de situações fáticas que servem de suporte para pedidos de indenização por ?danos morais experimentados pela classe obreira?.

No sentido de que os pedidos de indenização por danos morais decorrentes da relação de trabalho, devem merecer a mais atenta parcimônia interpretação por parte dos magistrados trabalhistas, precisas e pertinentes são as lições colhidas dos ensinamentos manifestados por Edilton Meireles[5], senão vejamos:

?…propugnar pela mais ampla ressarcibilidade do dano moral não implica no reconhecimento de todo e qualquer melindre, toda suscetibilidade exacerbada, toda exaltação do amor próprio, pretensamente ferido, a mais suave sombra, o mais ligeiro roçar de asas de uma borboleta, mimos, escrúpulos, delicadezas excessivas, ilusões insignificantes desfeitas, possibilitem sejam extraídas da Caixa de Pandora do Direito?.

E prossegue o ilustrado doutrinador antes referido:

?…para ter direito de ação, o ofendido deve ter motivos apreciáveis de se considerar atingido, pois a existência da ofensa poderá ser considerada tão insignificante que, na verdade, não acarreta prejuízo moral. O que queremos dizer é que o ato, tomado como desonroso pelo ofendido, seja revestido de gravidade (ilicitude) capaz de gerar presunção de prejuízo e que pequenos melindres incapazes de ofender os bens jurídicos não possam ser motivos de processos judiciais?.

Também neste mesmo sentido, são preciosas as considerações de Sérgio Cavalieri Filho[6] que diz que:

?Se dano moral é agressão à dignidade humana, não basta para configurá-lo qualquer contrariedade. Nessa linha de princípio, só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia-a-dia, no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais triviais aborrecimentos?.

Como se vê, não é qualquer dissabor ou aborrecimento tido como experimentado pelo empregado que possui o condão de repercutir no âmbito do Direito e, assim, servir de causa para indenização por alegado dano moral.

Certo é que caso não se coloque um freio, por intermédio de decisões dos magistrados trabalhistas, o instituto do dano moral estará relegado a uma posição de extrema inferioridade e vulnerabilidade na escala de valores jurídicos que devem ser preservados.

E neste sentido é que a punição para aventuras jurídicas travestidas de pedidos de indenização por danos morais, emerge como um instrumento jurídico que possui grandes possibilidades de impedir que, inadvertidamente, ainda tenhamos de conviver com pedidos absurdos rotulados de indenização por danos morais.

3 O ENRIQUECIMENTO ILÍCITO E A NECESSIDADE DE PUNIÇÃO DE PEDIDOS ?BANAIS? DE DANO MORAL

Como dito alhures, hodiernamente o Judiciário Trabalhista tem enfrentado com mais razoabilidade e rigor, as tentativas de enriquecimento ilícito travestidas de pedidos de danos morais.

Como sabemos, o magistrado não está adstrito e vinculado ao conjunto probatório para formar seu convencimento, porém existe uma necessidade de convicção de motivação, que deve ser utilizada no momento de, com subjetividade, perquirir sua consciência para analisar se diante de um pedido absurdo de indenização por danos morais, faz-se pertinente e necessária a aplicação de uma punição àquele que utiliza-se da já abarrotada máquina do Judiciário Trabalhista, para locupletar-se às custas de outra pessoa.

E não há como negar que um pedido absurdo de indenização por dano moral, que na verdade carrega consigo a real intenção de enriquecer-se indevidamente (entenda-se ilicitamente), configura ato de má-fé, o qual a processualística empresta mecanismos para coibir.

Inquestionavelmente, procede de modo temerário aquele que se utiliza da máquina judicial trabalhista, para alcançar objetivos levianos, causando prejuízos a outras pessoas (empregadores), e que não se coadunam com o nobre princípio de realizar a justiça.

Como já manifestado pelo ilustre doutrinador e jurista Nelson Nery Junior[7]: ?(…) havendo prejuízo, qualquer que seja o seu montante, deve ser indenizado integralmente pelo causador do dano. Entender-se o contrário é permitir que, pelo comportamento malicioso da parte, haja lesão a direito de outrem não inteiramente reparável, o que se nos afigura motivo de empobrecimento indevido da parte inocente, escopo que, por certo, não é perseguido pelo direito processual civil?.

Aqui se faz oportuno e esclarecedor registrar que as situações tipificadas no art. 17 do Código de Processo Civil, ilustram do ponto de vista fático, em quais condições pode haver o enquadramento de pedidos levianos (travestidos de indenização por danos morais), para determinar-lhes e impingir-lhes a punição e enquadramento como ?litigância de má-fé?.

E não é outro o entendimento manifestado também pelo Exmo. Min. Ives Gandra da Silva Martins Filho[8] no sentido de que não deve ?o Judiciário reconhecer o direito à indenização para todas as situações em que a parte alega desonra e humilhação, sob pena de serem consagrados desvirtuamentos que banalizam os bens protegidos, retirando a força própria da sanção que representa a imposição da indenização por dano moral?.

Portanto, como apontado alhures, desde que utilizado com razoabilidade e equilíbrio, o mecanismo chumbado no art. 17 do CPC, que trata da litigância de má-fé, deve ser aplicado pelos magistrados trabalhistas, como uma das formas de coibir e alimentar a reiteração de pedidos levianos de indenização de danos morais, travestidos de real objetivo de enriquecimento sem causa, às custas de outrem.

4 CONCLUSÃO

Como manifestado anteriormente, resta inescondível que hodiernamente, convivemos com um número cada vez mais avassalador de pedidos triviais de indenização por danos morais decorrentes da relação de trabalho, que além de desvirtuar e banalizar este nobre instituto do Direito, assoberba os cartórios das Varas do Trabalho, tomando tempo precioso dos magistrados para que se dediquem às causas que realmente impendem solução rápida e eficaz.

Por outro lado, também resta inquestionável que a processualística existente, notadamente o art. 17 do Código de Processo Civil, que caracteriza o condenável e temerário procedimento da litigância de má-fé, confere aos magistrados trabalhistas importante ferramenta que, uma vez utilizada com a parcimônia, firmeza e equilíbrio, por certo que produzirá o benéfico (e também pedagógico) efeito de expurgar do ambiente judicial trabalhista, as tentativas de aventura jurídica que são caracterizadas pelos pedidos absurdos, levianos e revestidos de inequívoca má-fé, rotulados de ?indenização por danos morais?, muito embora se reconheça, também, que os verdadeiros casos em que ocorra excesso e abalo á moral, mereçam  a justa aplicação do Direito.

[1] Advogado inscrito na OAB/SC sob nº 8874. Sócio Fundador do Escritório de Advocacia Piazera, Hertel, Manske & Pacher Advogados Associados (OAB/SC 1.029). Professor das disciplinas de Introdução ao Estudo do Direito e Direito Processual Civil III no Centro Universitário de Jaraguá do Sul ? Unerj. Vice-Presidente da OAB/SC ? 23ª Subseção ? Jaraguá do Sul ? gestão 2010/2012. Membro da Câmara de Relações Trabalhistas da Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina ? FIESC e filiado à Associação Catarinense dos Advogados Trabalhistas ? ACAT.

[2] MARTINS, Sergio Pinto. Dano Moral Decorrente do Contrato de Trabalho ? São Paulo : Atlas, 2007, p. 61.

[3] MARTINS, Sergio Pinto. Dano Moral Decorrente do Contrato de Trabalho ? São Paulo : Atlas, 2007, pp. 57/59.

[4] Processo 628-2006-055-15-00-5, TRT 15ª Região, Acórdão 71889/09, 12ª Câmara.

[5] In Aferição do Dano Moral Trabalhista, revista T & D, nr. 11/96.

[6] In programa de Responsabilidade Civil. 6ª edição, Ed, Malheiros, p. 105.

[7] JUNIOR, Nelson Nery Junior. Atualidades sobre o processo civil, RT, 2ª. Edição, pp. 32/33.

[8] In Revista Ltr. 68-04/475.

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