Relms G. S. Benevenutti[1]

 

Resumo: O presente artigo aborda a reparação do dano ambiental nos crimes da lei 9.605/98, a ser a principal e mais importante meta, eis que nela também está inserida a necessidade de adoção de medidas que tornem efetiva a precaução e tenham o condão de assumir o caráter repressivo. Deste modo, a luta pela defesa do meio ambiente tem encontrado no Direito Penal um de seus mais significativos instrumentos, eis que muitas são as hipóteses em que as sanções administrativas e civis não se mostram suficientes para a repressão das agressões ao ambiente.

 

Palavras-chave: Reparação do Dano Ambiental, Direito Ambiental, Meio Ambiente, Constituição Federal de 1988.

 

 

  1. 1.    Introdução

 

Apesar da criação de novos tipos penais ambientais ter representado certo avanço da legislação, o grande mérito da lei são as grandes modificações que este diploma legal trouxe ao direito penal ambiental, as quais foram: a) a efetivação do art. 225 da Constituição com a previsão de responsabilidade penal das pessoas físicas e jurídicas em decorrência da prática de crime ambiental e; b) a criação de hipóteses de imposição da obrigação de reparar o dano ambiental na esfera criminal, seja como pressuposto para aplicação de diversos institutos da nova lei, seja como modalidade de sanção penal.

Conforme se colhe da leitura da lei 9.099/95 em seu artigo 76:

 

Art. 76. Havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal pública incondicionada, não sendo caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multas, a ser especificada na proposta.

 

§ 1º Nas hipóteses de ser a pena de multa a única aplicável, o Juiz poderá reduzi-la até a metade.

 

§ Não se admitirá a proposta se ficar comprovado:

 I – ter sido o autor da infração condenado, pela prática de crime, à pena privativa de liberdade, por sentença definitiva;

II – ter sido o agente beneficiado anteriormente, no prazo de cinco anos, pela aplicação de pena restritiva ou multa, nos termos deste artigo;

III – não indicarem os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, ser necessária e suficiente a adoção da medida.

 

§ Aceita a proposta pelo autor da infração e seu defensor, será submetida à apreciação do Juiz.

 

§ 4º Acolhendo a proposta do Ministério Público aceita pelo autor da infração, o juiz aplicará a pena restritiva de direitos ou multa, que não importará em reincidência, sendo registrada apenas para impedir novamente o mesmo benefício no prazo de 5(cinco anos).

 

§ Da sentença prevista no parágrafo anterior caberá a apelação referida no art.82 desta lei[2].

 

Pode-se afirmar que a preocupação do legislador na elaboração da Lei 9.605/98 não foi a de criar graves penalidades aos novos crimes ambientais, mas, sim, a reparação dos danos ambientais no âmbito de aplicação desta norma.

Os artigos 8.º, incisos I e IV, que cita que as penas restritivas de direito  prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária; cominados com o art. 9.º e 12 da Lei 9.605/98, embasa que as penalidades restritivas de direitos consistentes na prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária, tem por objetivo e finalidade, no caso da primeira sanção (prestação de serviço à comunidade), a restauração dos danos causados, se possível, em se tratando de crime que envolva dano da coisa particular, pública ou tombada, enquanto a segunda (prestação pecuniária) consiste no pagamento em dinheiro à vítima ou à entidade pública ou privada com fim social, de importância, fixada pelo juiz, destinada a ser deduzida do montante de eventual reparação civil a que for condenado o infrator.

A prestação de serviços à comunidade consiste na atribuição ao condenado de tarefas gratuitas junto a parques e jardins públicos e unidades de conservação, e, no caso de dano da coisa particular, pública ou tombada, na restauração desta, se possível.

Visto que a prestação pecuniária consiste no pagamento em dinheiro à vítima ou à entidade pública ou privada com fim social, de importância, fixada pelo juiz, não inferior a um salário mínimo nem superior a trezentos e sessenta salários mínimos. O valor pago será deduzido do montante de eventual reparação civil a que for condenado o infrator.

Nos crimes ambientais de menor potencial ofensivo, a proposta de aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multa, prevista no art. 76 da Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, somente poderá ser formulada desde que tenha havido a prévia composição do dano ambiental, de que trata o art. 74 da mesma lei, salvo em caso de comprovada impossibilidade.

O artigo 89 in verbis;

 

As disposições do art. 89 da Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, aplicam-se aos crimes de menor potencial ofensivo definidos nesta Lei, com as seguintes modificações:

 

I – a declaração de extinção de punibilidade, de que trata o § 5º do artigo referido no caput, dependerá de laudo de constatação de reparação do dano ambiental, ressalvada a impossibilidade prevista no inciso I do § 1º do mesmo artigo;

 

II – na hipótese de o laudo de constatação comprovar não ter sido completa a reparação, o prazo de suspensão do processo será prorrogado, até o período máximo previsto no artigo referido no caput, acrescido de mais um ano, com suspensão do prazo da prescrição;

 

III – no período de prorrogação, não se aplicarão as condições dos incisos II, III e IV do § 1º do artigo mencionado no caput;

 

IV – findo o prazo de prorrogação, proceder-se-á à lavratura de novo laudo de constatação de reparação do dano ambiental, podendo, conforme seu resultado, ser novamente prorrogado o período de suspensão, até o máximo previsto no inciso II deste artigo, observado o disposto no inciso III;

 

V – esgotado o prazo máximo de prorrogação, a declaração de extinção de punibilidade dependerá de laudo de constatação que comprove ter o acusado tomado as providências necessárias à reparação integral do dano.

 

Não estando o autor da infração ou do fato em nenhuma das circunstâncias acima descritas  e aceita a proposta pelo mesmo, será esta, submetida à apreciação do magistrado. Acolhendo a proposta do Ministério Público aceita pelo autor da infração, o juiz aplicará a pena restritiva de direitos ou multa, que não importará em reincidência, sendo registrada apenas para impedir novamente o mesmo benefício no prazo de cinco anos. Importante ressaltar que o autor do fato, ao aceitar a proposta de transação penal oferecida pelo promotor, não estará com isso reconhecendo a culpa pelo crime que é acusado, deste modo, não perderá a primariedade. 

Não constará anotação para fins de antecedentes criminais, salvo para impedir que seja o autor seja beneficiado com uma nova transação penal no prazo de cinco (5) anos, conforme descreve o parágrafo 6° do art. 72 da Lei 9.099/95.   

A imposição da sanção de que trata o § 4° deste artigo não constará de certidão de antecedentes criminais, salvo para os fins previstos no mesmo dispositivo, e não terá efeitos civis, cabendo aos interessados propor ação cabível no juízo cível.

 

2.     POSIÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA 

 

De igual modo, o Superior Tribunal de Justiça tem se manifestado pela composição civil dos danos, se possível, será realizada através da conciliação conduzida pelo juiz ou por conciliador, sob a orientação daquele (art. 73, Lei 9.099/95), sendo reduzida a termo e homologada pelo juiz mediante sentença irrecorrível, que terá eficácia de título executivo a ser executado no juízo cível.

A Lei nº 9.099/95, que veio para promover uma mudança radical na clássica mentalidade exclusivamente repressiva, desde o art. 2º fala em “conciliação” e “transação”.

No art. 62 estabeleceu os objetivos centrais do processo perante o Juizado Criminal: “reparação dos danos sofridos pela vítima e aplicação de pena não privativa de liberdade”. Com isso está decretada o fim da concepção “paleorepressiva”, ao menos no que concerne às infrações de menor potencial ofensivo. O novo sistema já não tem a preocupação exclusiva de atender a pretensão punitiva do Estado (somente castigar). Em primeiro lugar agora está à reparação dos danos, que deve ser feita “sempre que possível”.

Oportuno, no nosso entendimento que sejam transcritas algumas ementas para um melhor entendimento sobre o instituto da transação penal e a visão dos nossos tribunais:

 

APELAÇÃO CRIMINAL – CRIME AMBIENTAL E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO EM CONCURSO MATERIAL – ERRO DE PROIBIÇÃO – ARGUIÇÃO QUE NÃO SE SUSTENTA, MÁXIME QUANDO OS AGENTES ESCONDIAM AS ARMAS E AS AVES ABATIDAS EM FUNDO FALSO DO AUTOMÓVEL, O QUE FAZ PRESUMIR A CIÊNCIA DO ILÍCITO PRATICADO – AVES QUE ESTARIAM DESTRUINDO PLANTAÇÕES – FATO NÃO PROVADO E QUE AINDA ASSIM NÃO JUSTIFICARIA A CONDUTA PERPETRADA – PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA JURÍDICA – INAPLICABILIDADE – OS DANOS À NATUREZA HÃO DE SER SEVERAMENTE PUNIDOS, SOB PENA DE COMPROMETIMENTO DO ECOSSISTEMA – ABSOLVIÇÃO – PLEITO QUE NÃO SE SUSTENTA EM PROVA HÁBIL – CONDENAÇÃO QUE SE IMPÕE – SUBSTITUIÇÃO DE PENA ALTERNATIVA POR PRISÃO DOMICILIAR – REQUERIMENTO QUE AFRONTA AS REGRAS ESPECÍFICAS DITADAS PELO ART. 117 DA LEI DE EXECUÇÕES PENAIS – RECURSO DESPROVIDO. Apelação Criminal n. 2005.040999-7, de São Miguel do Oeste. Relator: Juiz Tulio Pinheiro.

 

Nessa corte há entendimento:

 

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – AMBIENTAL – PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE AD CAUSAM DO MINISTÉRIO PÚBLICO, CERCEAMENTO DE DEFESA E INOBSERVÂNCIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL AFASTADAS – CRIAÇÃO DE GALOS DE BRIGA, ROLINHAS EXÓTICAS E GARNISÉS EM ÁREA URBANA – VULTOSA QUANTIDADE DE AVES – POLUIÇÃO SONORA E ATMOSFÉRICA – ESPÉCIES CRIADAS SEM A DEVIDA CONTENÇÃO E SEM AS ADEQUADAS CONDIÇÕES DE HIGIENE – ILEGALIDADE – LEGISLAÇÃO FEDERAL E MUNICIPAL – EXEGESE DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ART. 225 – LEI COMPLEMENTAR N. 84/00 (CÓDIGO DE POSTURAS DO MUNICÍPIO DE JOINVILLE) – LEI FEDERAL N. 6.938/81 (POLÍTICA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE) – RESOLUÇÃO CONAMA N. 002/90 – DESPROVIMENTO DO APELO. Apelação Cível n. 2005.041621-5, de Joinville. Relator: Des. Francisco Oliveira Filho.

 

Ou ainda:

 

JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL TRANSAÇÃO PENAL ? APLICABILIDADE DO INSTITUTO AO ACUSADO DO CRIME DO ART. 60 DA LEI 9.605/98 ? NECESSIDADE. É necessária a aplicação do instituto previsto no art. 76 da Lei 9.099/95 ao acusado do crime do art. 60 da Lei 9.605/98, uma vez que tal delito prevê pena de 1 a 6 meses de detenção, ou multa, ou ainda ambas as sanções cumulativamente, e o art. 27 deste último diploma prevê a possibilidade de transação penal, nos termos do referido dispositivo da lei dos juizados especiais criminais, sendo certo que é nula a decisão de reconhecimento da denúncia, se não houve designação de audiência preliminar (TACrimSP ? 8ª Cam –  HC 382230/8 ? rel. René Nunes ? j.19.04.2001).  

 

Portanto, a doutrina vem se firmando majoritariamente o posicionamento jurisprudencial que defende a sanção penal e a responsabilização penal da pessoa física em decorrência do cometimento de crime ambiental.

 

 

3.    CONCLUSÃO

 

Nesse sentido, o legislador pátrio focando a proteção ambiental, consolidou através da Lei n. 9.605/98 a legislação penal ambiental no país, permitindo, por meio da benesse legal identificada na Transação Penal a luz da lei 9.099/95, a possibilidade de se aplicar as penas restritivas de direitos aos crimes ambientais de menor potencial ofensivo, mediante a prévia composição e reparação dos meios pelos quais haveria a recuperação dos danos ambientais.

Por todo o exposto, constata-se, que a reparação é um preceito constitucional muito importante na luta pela preservação do meio ambiente, de modo que sua aplicação nos dias atuais não pode ser obscurecida, especialmente, considerando a possibilidade que o Direito possui de atualizar seus institutos às novas alterações e necessidades sociais.

 

 

5-  BIBLIOGRAFIA

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2000.

MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente: doutrina, jurisprudência, glossário. 4 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.



[1] Graduada em Direito pela Unerj; Estudante de  Pós graduação em Direito Ambiental e Urbanístico pela Instituição Luiz Flávio Gomes e advogada do escritório  Piazera, Hertel, Manske & Pacher Advogados Associados –    E-mail: relms@phmp.com.br

 

[2] Art.82. Da decisão de rejeição da denúncia ou queixa e da sentença caberá apelação, que poderá ser julgada por turma composta de 3 (três) juízes em exercício no primeiro grau de jurisdição, reunidos na sede do Juizado.

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