Julio Max Manske[i]

Todos acompanhamos os desdobramentos de cada etapa da operação Lava Jato, onde a cada fase, novos fatos vem a tona e cada vez pessoas e empresas com maior destaque tem seus nomes envolvidos em escândalos de corrupção.

Participamos e apoiamos os atos de protesto contra a corrupção em todos os níveis do Governo, exigindo medidas severas para extirpar, definitivamente, o que está sendo tratado como mal do século (embora milenar sua existência).

Assistimos as notícias e tocamos nossa vida, tratando do assunto em rodas de conversas e eventuais discussões entre colegas, mas não percebemos como os desdobramentos dessa operação, imporá modificações que nos atingirão diretamente, em curto espaço de tempo.

Isso porque, um dos resultados dos protestos de rua, foi a regulamentação da Lei 12.846/13, que dispõe sobre a responsabilidade administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública (Decreto 8420/15).

A Lei 12.846/13, também conhecida com “Lei da Empresa Limpa”, trouxe para a empresa, o compromisso de combater, internamente, atos de corrupção passíveis de serem cometidos não apenas por seus colaboradores, mas também por seus fornecedores, prestadores de serviços, agentes intermediários e associados.

Por atos de corrupção, não se entende apenas a entrega, ou promessa, de propina a um funcionário público, outros atos como fraude, impedimento, perturbação a licitação, ou mesmo procurar afastar licitante, mediante oferecimento de vantagens, assim como criar, de modo fraudulento, pessoa jurídica para participar de licitação ou contato administrativo, também são conceituados como atos de corrupção.

Deste modo, ocorrendo um ato de corrupção que envolva a empresa de alguma forma, será esta responsabilizada mesmo que não tenha sido beneficiada (é o que se chama de responsabilidade objetiva). Esta responsabilização implica na fixação de uma multa, que pode variar de 0,1% a 20% do seu faturamento bruto do ano anterior, descontados os tributos, assim como na possibilidade de restringir a empresa de participar em licitações ou mesmo contratar com a administração pública, em qualquer de suas esferas (Federal, Estadual, Municipal, Autarquias, etc).

Para minorar os percentuais da multa ou mesmo evitar a ocorrência de atos desta natureza, sugere-se que a empresa desenvolva seu programa de integridade (compliance).  Este programa é previsto tanto Lei da Empresa Limpa, como também no seu regulamento, especificando os requisitos que o programa deve conter. A Controladoria Geral da União, responsável por formalizar acordos com as empresas que confessarem a prática de ilícitos, já publicou Portaria estabelecendo as regras para avaliação destes programas (Portarias CGU 909/15 e 910/15).

Programa Integridade, ou Compliance, consiste no conjunto de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e na aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta, políticas e diretrizes com objetivo de detectar e sanar desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos praticados contra a administração pública, nacional ou estrangeira (art. 41, Decreto 8.420/15).

Um programa de integridade elaborado com os requisitos exigidos pela legislação, assim como a demonstração do seu efetivo funcionamento, com histórico de dados, estatísticas e casos concretos, servirá não apenas para evitar a ocorrência de irregularidades e a pronta tomada de decisões na medida de seus acontecimentos, como também poderá reduzir eventual multa aplicada em até 4% (dos 20% possíveis).

Além disso, envolvendo-se a empresa em ato de corrupção, poderá fazer um acordo com a Corregedoria Geral da União, objetivando mitigar a multa, assim como manter-se em condições de contratar com o poder público, inclusive participando de licitações. Esse acordo é chamado de acordo de leniência e uma das suas exigências, é a adoção, aplicação ou aperfeiçoamento do programa de integridade.

O Programa de Integridade, no entanto, não serve unicamente para evitar o cometimento de atos de corrupção, reduzir eventual aplicação de multa ou mesmo permitir a celebração de acordo de Leniência. O Programa de Integridade tem como finalidade ainda maior, manter a empresa seguindo as regras que devam ser seguidas, sejam aquelas estabelecidas por normas legais (de acordo com sua localização e natureza da atividade), que podem ser divididas em tributárias, trabalhistas, ambientais, sociais, dentre outras, como também nas normas internas, previstas em Códigos de Ética e Conduta que refletem o perfil de cada empresa.

A pesquisa global da Thomson Reuters sobre compliance de 2015, realizada com cerca de 600 empresas, indicou que 70% dos executivos esperam a publicação de mais normas regulatórias neste ano. O Programa de Integridade, tem como um de seus braços, monitorar as normas que regulam a atividade da empresa, evitando que essa venha a ser autuada pelo descumprimento de normas relativas ao setor que atua. O Programa, como se observa, atua de forma preventiva, antecipando a ocorrência de riscos.

Além disso, o Programa de Integridade, se utilizado de modo efetivo, serve para identificar a ocorrência de crimes internos, sendo praticados contra a empresa, por seus colaboradores ou terceiros.

Retira-se da Pesquisa Global sobre Crimes Econômicos, feita com 5.128 executivos de 95 países, sendo 132 deles do Brasil, que a ocorrência de Roubos de Ativos da empresa, lidera o número de ocorrências com 69%, seguido pela fraude em compras com 29% e, apenas em terceiro lugar, suborno e corrupção, com 27%.

Deste modo, observa-se que o Programa de Integridade não deve ser visto como algo único das grandes empresas, pois independente do tamanho, cada empresa deve personalizar seu procedimento de obediência a normas legais e internas, estabelecendo procedimentos para divulgação e monitoramento do seu funcionamento. Referido programa, mais do que atender as previsões da Lei da Empresa Limpa, serve de segurança ao empresário, proprietários das cotas de sua empresa, assim como dos acionistas, reais “donos” de sociedades anônimas que possuem diretores transitórios no comando de suas empresas.

Vale ressaltar, por fim, que já é bastante comum, a previsão, em editais de licitação, a exigência da empresa participante, da apresentação de seu programa de integridade como condição de participar do certame. Para a empresa que antecipar-se, criando seu programa previamente, eventual adequação será muito mais rápida e efetiva, do que sua concorrente, que deverá criar e implantar um programa desde seu início, para continuar com suas atividades.

A tendência é que a Administração Pública, direta e indireta, somente possa contratar com empresas detentoras de programas de integridade, como forma de evitar a ocorrência de atos de corrupção e evitar novos escândalos como os assistidos diariamente.

Da mesma forma, os financiamentos promovidos com verba pública (BNDES, BRDE), passarão a exigir, das empresas interessadas em suas linhas de crédito, a demonstração da existência do Programa de Integridade.

Enfim, objetiva-se demonstrar que o Programa de Integridade deve ser visto pelo empresário não como um custo para a empresa, mas sim, como ferramenta de auxílio e segurança da integridade, valor e patrimônio da sua empresa.



[i] Graduado em Direito pela Fundação Universidade Regional de Blumenau (1998); Especialização em Direito Penal Econômico Internacional pela Universidade de Coimbra (Portugal) em convênio com o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCCrim (2007); Especialização em Corrupção, Crime Organizado e Terrorismo pela Universidade de Salamanca (Espanha 2011); Especializando em Gestão de Comércio Exterior e Negócios Internacionais pela FGV (2015); Sócio da Piazera Hertel Manske & Pacher Advogados, Coordenador do Departamento de Direito Comercial.

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