Atualmente, no Judiciário brasileiro, não são poucas as demandas que versam sobre vícios construtivos em empreendimento imobiliários, a exemplo: dimensões diferentes do projeto original, material de acabamento distinto do que consta no memorial descritivo, infiltrações, trincas/fissuras, defeitos nas instalações elétricas, etc.

Geralmente, os autores dessas demandas são os proprietários das unidades, quando verificados problemas em seu apartamento/sala comercial ou, o próprio condomínio, quando da identificação de vícios localizados nas áreas de uso comum do empreendimento (salão de festas, quadra de esportes, churrasqueiras, piscinas, etc.).

Com relação as causas, tais vícios podem ser decorrentes de erros na elaboração do projeto ou na execução, ou ainda, quando da insuficiência de informações sobre a utilização do bem e uso diverso quanto a real finalidade do imóvel (ex: imóvel residencial utilizado para fins comerciais).

Importante mencionar, que os vícios podem ser aparentes, ou seja, falhas que estão visíveis e podem ser facilmente identificadas quando da entrega da obra ou, ocultos, falhas que se manifestam após a entrega e durante o uso.

Sendo assim, diante da expansão dos serviços prestados pela área da construção civil, em especial aqueles que envolvem o fornecedor e o consumidor, é essencial que ambas as partes (adquirente e construtora/incorporadora) tenham ciência de suas responsabilidades, prazos e garantias.

  1. DA RESPONSABILIDADE

Nos termos do art. 618 do Código Civil, confere a construtora, a entrega do imóvel ao adquirente, em perfeito estado e em plenas condições de uso. Logo, aquele que é responsável por executar a obra responde pela solidez e segurança do trabalho realizado.

Esta responsabilidade, ainda, pode ser atribuída também a incorporadora e ao engenheiro civil. Veja, embora o incorporador não seja o executor direto da obra, é ele quem contrata o fornecedor para executá-la. Por sua vez, o engenheiro é o profissional responsável pela elaboração dos documentos técnicos e acompanhamento da obra, o que faz com que ambos possam ser chamados a responder solidariamente (em conjunto) com a construtora.

Ainda que o construtor, incorporador ou engenheiro não conheçam do vício existente no imóvel, todos responderão de forma objetiva, ou seja, o desconhecimento não os exime de sua responsabilidade em entregar o empreendimento livre de vícios.

Além da responsabilidade pela solidez e segurança da construção, existe a:

  1. a) Responsabilidade contratual: onde todas as partes, seja construtora, adquirente e demais fornecedores devem cumprir com as obrigações pactuadas para realização de um determinado trabalho e aquisição do imóvel.
  2. b) Responsabilidade pelos materiais: onde incumbe a construtora escolher os materiais que serão utilizados na obra, por consequência, responder por vícios que se apresentem no empreendimento quando da utilização de materiais de má qualidade.

Por outro lado, exclui-se da responsabilidade dessas figuras os vícios decorrentes de mau uso do imóvel, falta de conservação, manutenção e cuidado por parte do adquirente, desgastes naturais, vícios decorrentes de caso fortuito ou ainda, aqueles decorrentes de alterações que o próprio adquirente tenha introduzido no projeto e nas especificações técnicas (ex: adicionar outro pavimento ao empreendimento sabendo do risco à sustentação e consequente queda).

  1. DA GARANTIA

A responsabilidade pela solidez e segurança do empreendimento, atribuída ao construtor, incorporador e ao engenheiro, consiste em uma garantia que perdurará pelo prazo de 5 anos, nos termos do art. 618 do Código Civil, não sendo possível que estes reduzam sua amplitude ou se desobriguem, mesmo através de cláusula contratual.

Em contrapartida, diante da universalidade de itens que compõem um empreendimento, este prazo de 5 anos não pode ser levado “ao pé da letra” para a totalidade da construção. Isto porque, itens com vida útil inferior (pinturas, alteração de cor, revestimento de paredes, etc.) não podem ser comparados aqueles relacionados à segurança e integridade da obra (fundações, contenções, telhado, etc.).

Diante disso, como forma de trazer equilíbrio à relação entre o construtor/incorporador e os adquirentes, a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) e Sindicatos da Construção Civil tem editado normas e recomendações especificando o elemento componente do empreendimento e seu recomendado prazo de garantia, sendo necessária uma interpretação harmoniosa da legislação e demais normas, alinhadas a vida útil esperada do produto/serviço e as expectativas do adquirente/fornecedor.

  1. DOS PRAZOS

No que se refere ao adquirente, quando da aquisição e identificação de vícios no imóvel, este deve atentar-se aos prazos para eventuais reclamações, a fim de evitar prejuízos ao direito que lhe assiste de reparação.

Quando se tratar de vícios aparentes – de fácil constatação, o prazo será de 90 (noventa) dias a contar da entrega do imóvel, como prevê o art. 26, inciso II do Código de Defesa do Consumidor:

Art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em:
[…]
II – noventa dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos duráveis.

Neste caso, a construtora tem o prazo de 30 (trinta) dias para sanar o vício e providenciar o reparo, caso contrário, o adquirente poderá requerer a substituição do imóvel, restituição da quantia paga ou o abatimento proporcional do preço (art. 18, §1°, CDC).

Quanto se tratar de vícios ocultos – não visíveis ao tempo da entrega do imóvel, duas possibilidades devem ser analisadas:

a) Se ocorrer dentro do período de 5 anos da entrega da obra, período em que construtor, incorporador e engenheiro são legalmente responsáveis pela solidez e segurança do empreendimento, o adquirente deve reclamar no prazo de 180 dias a contar do dia em que o vício for descoberto (art. 618, parágrafo único, Código Civil), requerendo a rescisão contratual ou o abatimento do valor, e;

b) Se ultrapassado o prazo de 5 anos, quando “cessa” legalmente a responsabilidade do construtor, incorporador e engenheiro, o adquirente deverá requerer a indenização por perdas e danos (sem rescisão contratual ou abatimento do valor) no prazo de 10 anos a contar do dia em que ficar evidenciado o vício (art. 205, Código Civil). Em resumo:

Tais prazos são importantes para ambas as partes, trazem segurança jurídica e possuem explicação muito clara: não se pode eternizar a responsabilidade da construtora por vícios decorrentes do empreendimento.

  1. CONCLUSÃO

Diante de todo o exposto, buscando a resolução pacífica dos problemas ocasionados por vícios no empreendimento, é fundamental que adquirente, construtor, incorporador e engenheiro busquem, primeiramente, as vias extrajudiciais, identificando eventual falha existente e propondo uma forma de solucionar, recorrendo em últimos casos às vias judiciais.

Além disso, a elaboração de documentos como Manual do Proprietário, Memorial Descritivo, Diário de Obra do engenheiro e um bom contrato jurídico, são fundamentais, considerando que trarão especificações sobre as regras e formas de utilização do imóvel, critérios dos materiais que serão empregados no empreendimento, ocorrências diárias da obra e obrigações para todos os envolvidos.

Compreender todas essas questões, direitos e a importância de documentar as informações, propicia uma gestão de risco compartilhada quanto aos vícios construtivos, onde cada parte tem ciência do seu papel na manutenção do empreendimento, desde a sua execução até posterior entrega e utilização.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Brasília, 10 jan. 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm>. Acesso em: 23 jun. 2022.

BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990. Código de Defesa do Consumidor. Brasília, 11 set. 1990. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/I8078compilado.htm>.

Acesso em: 23 jun. 2022.

MONTEIRO FILHO, Carlos Edison do Rêgo; ROSENVALD, Nelson. Vícios construtivos e relação de consumo: liability, accountability e responsibility. Consultor Jurídico, 2 mar. 2022. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2022-mar-02/garantias-consumo-vicios-construtivos-consumo-liability-accountability-responsibility>.

Acesso em: 23 jun. 2022.

DOS SANTOS, Lourdes Helena Rocha et al. Temas atuais em Direito Imobiliário. Porto Alegre, 2018.

        

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